CSM/SP: Doação com reserva de usufruto. Beneficio instituído em graus. Caracterização de usufruto sucessivo. Vedação legal. Recurso não provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.213-6/1, da Comarca de ARAÇATUBA, em que é apelante MAURO CÉSAR FILETO e apelado o OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS, TÍTULOS E DOCUMENTOS E CIVIL DE PESSOA JURÍDICA da referida Comarca.

ACORDAM os Desembargadores do Conselho Superior da Magistratura, por votação unânime, em negar provimento ao recurso, de conformidade com o voto do relator que fica fazendo parte integrante do presente julgado.

Participaram do julgamento, com votos vencedores, os Desembargadores ROBERTO VALLIM BELLOCCHI, Presidente do Tribunal de Justiça, MUNHOZ SOARES, Vice-Presidente do Tribunal de Justiça, BARRETO FONSECA, Decano em exercício, VIANA SANTOS, RODRIGUES DA SILVA e EDUARDO PEREIRA, respectivamente, Presidentes das Seções de Direito Público, Direito Privado e da Seção Criminal do Tribunal de Justiça.

São Paulo, 15 de dezembro de 2009.

(a) REIS KUNTZ, Corregedor Geral da Justiça e Relator

VOTO

REGISTRO DE IMÓVEIS – Escritura pública de doação com reserva de usufruto – Acesso Negado – Hipótese de usufruto sucessivo – Irregistrabilidade – Dúvida procedente – Recurso não provido.

Trata-se de apelação interposta por Mauro César Fileto contra sentença que julgou procedente dúvida suscitada pelo Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Araçatuba, mantendo a negativa de registro de escritura pública de doação com reserva de usufruto relativa ao imóvel matriculado sob número 30.960, sob o fundamento de instituir usufruto sucessivo que é vedado por lei.

O apelante sustentou, em suma, que a escritura de doação em tela não prevê o usufruto sucessivo, mas sim contempla o direito de acrescer, que é lícito.

A Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso.

É o relatório.

O presente recurso não merece provimento.

Conforme se verifica da escritura juntada a fls.17/18, Adelino Squiçato e sua mulher Nelzira Luzia Druzian Squiçato doaram a Ayla Simões Squiçato o imóvel matriculado sob n° 30.960, com reserva de usufruto em favor de Renata Simões, em primeiro grau, e, na falta desta ou em virtude de sua desistência, em favor de Alberto Squiçato, em segundo grau.

Trata-se de inequívoca hipótese de usufruto sucessivo, que é vedado em lei.

O usufruto é sempre temporário, não sendo admitida a sua perpetuidade.

De acordo com o artigo 1.410 do Código Civil, “o usufruto extingue-se, cancelando-se o registro no Cartório de Registro de Imóveis:

I – pela renúncia ou morte do usufrutuário;

II – pelo termo de sua duração;

III – pela extinção da pessoa jurídica, em favor de quem o usufruto foi constituído, ou, se ela perdurar, pelo decurso de trinta anos da data em que se começou a exercer;

IV – pela cessação do motivo de que se origina;

V – pela destruição da coisa, guardadas as disposições dos artigos 1.407, 1.408, 2ª parte, e 1.409;

VI – pela consolidação;

VII – por culpa do usufrutuário, quando aliena, deteriora, ou deixa arruinar os bens, não lhes acudindo com os reparos de conservação, ou quando, no usufruto de títulos de crédito, não dá às importâncias recebidas a aplicação prevista no parágrafo único do artigo 1.395;

VIII – Pelo não uso, ou não fruição, da coisa em que o usufruto recai (artigos 1.390 e 1.399).”

Já o artigo 1.411 do Código Civil prevê que “constituído o usufruto em favor de duas ou mais pessoas, extinguir-se-á a parte em relação a cada uma das que falecerem, salvo se, por estipulação expressa, o quinhão desses couber ao sobrevivente.”

Os precedentes do Egrégio Conselho Superior da Magistratura de há muito têm se posicionado no sentido de não ser registrável escritura em que se pactue o usufruto sucessivo.

Nesse sentido, veja a Apelação Cível n° 001395-0, da Comarca de Catanduva, em que foi relator o eminente Desembargador Bruno Affonso de André, então Corregedor Geral da Justiça, em que restou consignado:

“O usufruto sucessivo – instituído em favor de uma pessoa para, com sua morte, ser transmitido a outra – é vedado pelo Código Civil. Com efeito, segundo o preceito do artigo 739 (inc. I), o usufruto extingue-se com a morte do usufrutuário, sendo transferível, ademais, por alienação, somente ao proprietário da coisa (art. 717).

“Essa modalidade de usufruto, outrora permitida pelas antigas ordenações, não é mais tolerada pelo Código” – aduz WASHINGTON DE BARROS MONTEIRO -, que prossegue: “De acordo com a sistemática do nosso direito, o usufruto tem duração máxima, prefixada pelo legislador e insusceptível de prorrogação: a morte do usufrutuário”. E completa: “Trata-se de norma de ordem pública, não modificável pelas partes” (“Curso de Direito Civil – Direito das Coisas”, pág. 306, Saraiva, 19ª ed. 1979).

“Eis porque agiu corretamente o Oficial suscitante, recusando-se a proceder ao registro da cláusula do usufruto sucessivo. Não poderia, mesmo, registrar o que a lei não permite.”

Não se trata de direito de acrescer, como sustentado pelo apelante, uma vez que os usufrutuários não foram contemplados simultaneamente, mas sim com diferença de graus, ou seja, o usufrutuário Alberto Squiçato só será contemplado com o usufruto em tela na hipótese de falta ou desistência da usufrutuária de primeiro grau, Renata Simões.

Não merece reparo, portanto, a decisão de primeiro grau, que manteve a negativa de registro do título em exame.

Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento ao recurso.

(a) REIS KUNTZ, Corregedor Geral da Justiça e Relator (D.J.E. de 13.04.2010)