CSM|SP: Registro de imóveis – Dúvida – Carta de adjudicação – Ausência de prévia averbação da incorporação da sociedade que consta da matrícula como proprietária do imóvel – Desnecessidade – Matéria já examinada na esfera judicial – Recurso provido.

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação n° 0071216-61.2013.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que é apelante GENNY AUN, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA CAPITAL.
ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “DERAM PROVIMENTO AO RECURSO. VENCIDO O DESEMBARGADOR RICARDO MAIR ANAFE, QUE DECLARARÁ VOTO.“, de conformidade com o voto do(a) Relator(a), que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Desembargadores JOSÉ RENATO NALINI (Presidente), EROS PICELI, GUERRIERI REZENDE, ARTUR MARQUES, PINHEIRO FRANCO E RICARDO ANAFE.
São Paulo, 17 de março de 2015.
HAMILTON ELLIOT AKEL
CORREGEDOR GERAL DA JUSTIÇA E RELATOR
Apelação Cível n° 0071216-61.2013.8.26.0100
Apelante: Genny Aun
Apelado: 5° Oficial de Registro de Imóveis da Capital
VOTO N° 34.159
Registro de imóveis – Dúvida – Carta de adjudicação – Ausência de prévia averbação da incorporação da sociedade que consta da matrícula como proprietária do imóvel – Desnecessidade – Matéria já examinada na esfera judicial – Recurso provido.
Trata-se de recurso interposto por Genny Aun contra a r. decisão de fls. 124/127, que manteve a recusa do 5° Oficial de Registro de Imóveis de São Paulo ao registro de carta de adjudicação.
Alega que adquiriu imóvel de “Sociedade Religiosa e Beneficente Israelita Lar dos Velhos” em 19.11.1999 sem que lhe fosse outorgada a escritura definitiva na ocasião e que referida sociedade foi incorporada pela “Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Hospital Albert Einstein”, contra quem moveu Ação de Adjudicação Compulsória tendo por objeto o referido imóvel. Pretende o registro da Carta de Adjudicação, da qual consta a incorporação havida, o que permite a averbação da alteração da denominação social. Sustenta, por fim, que não houve incorporação do imóvel em questão ao patrimônio da “Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Hospital Albert Einstein”, uma vez que foi negociado com a requerente em data anterior à incorporação.
A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 154/157).
É o relatório.
A recorrente pretendeu registrar carta de adjudicação expedida nos autos de Ação de Adjudicação Compulsória ajuizada em face de “Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Hospital Albert Einstein”, sucessora, por incorporação, da “Sociedade Religiosa e Beneficente Israelita Lar dos Velhos” (fls. 19/20 e documentos).
A recusa ao registro decorreu da ausência da prévia averbação da incorporação desta última por aquela primeira sociedade.
Ocorre que tal incorporação está perfeitamente demonstrada nos autos, e especialmente no título qualificado.
Além disso, se o na ação de adjudicação compulsória aceitou-se, foi aceita a presença, no polo passivo, da “Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Hospital Albert Einstein” porque era a sucessora da “Sociedade Religiosa e Beneficente Lar dos Velhos”, essa questão não pode ser rediscutida na qualificação registral, porque já superada na esfera jurisdicional. Incide aqui, a regra do art. 474, do Código de Processo Civil:
Passada em julgado a sentença de mérito, reputar-se-ão deduzidas e repelidas todas as alegações e defesas, que a parte poderia opor assim ao acolhimento como à rejeição do pedido.
Assim, há elementos bastantes para realização do registro pretendido, até porque a recorrente não tem, diante da inércia da Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Hospital Albert Einstein, como promover a averbação da incorporação exigida pelo registrador.
Ante o exposto, dou provimento ao recurso para fim de determinar o registro do título.
HAMILTON ELLIOT AKEL
CORREGEDOR GERAL DA JUSTIÇA E RELATOR
Apelação Cível n. 0071216-61.2013.8.26.0100
Apelante: Genny Aun
Apelado: 5° Oficial do Registro de Imóveis da Capital
TJSP- VOTO N° 22.072
DECLARAÇÃO DE VOTO DIVERGENTE
Registro de Imóveis.
Carta de adjudicação expedida em ação de adjudicação compulsória – Impossibilidade de registro sem a prévia averbação da extinção da sociedade proprietária do imóvel, incorporada pela parte ré – Princípio da continuidade (artigos 195 e 237 da Lei 6.015/1976) – Dúvida procedente.
Recurso desprovido.
1. Cuida-se de apelação contra decisão proferida pelo Juízo Corregedor Permanente do 5° Oficial de Registro de Imóveis da Comarca da Capital, que julgou procedente a dúvida suscitada.
A dúvida, em apertada síntese, consiste na possibilidade ou não de se registrar carta de adjudicação expedida nos autos da ação de adjudicação compulsória movida contra quem não figura como proprietário no registro de imóveis.
É o relatório.

  1. Respeitado entendimento diverso do Excelentíssimo Desembargador Relator Corregedor Geral da Justiça, o recurso não merece provimento.

Com efeito, o imóvel de matrícula n. 24.908 figura no Registro de Imóveis como sendo de propriedade de “SOCIEDADE RELIGIOSA E BENEFICENTE ISRAELITA LAR DOS VELHOS” (fl. 36/37).
A ação de adjudicação compulsória, data vênia desnecessária na hipótese, diga-se en passant, diante da existência deescritura pública de venda e compra (fl. 104/106), não tem o condão desubstituir a averbação da extinção da antiga sociedade proprietária,incorporada por outra sociedade (“SOCIEDADE BENEFICENTEISRAELITA BRASILEIRA HOSPITAL ALBERT EINSTEIN”).
A necessidade dessa averbação é decorrência do princípio da continuidade, inafastável mesmo diante de título judicial, que também deve passar pelo crivo da legalidade.
O que se busca com os Registros Públicos desde os seus primórdios é a maior fidelidade possível à realidade existente no mundo jurídico. Isso para evitar que alguém possa dispor de algo que não é seu, sempre como norte as máximas romanas do suum cuique tribuere e neminem laedere.
Consoante ensinamento de Afrânio de Carvalho:
“o princípio de continuidade, que se apoia no de especialidade, quer dizer que, em relação a cada imóvel, adequadamente individuado, deve existir uma cadeia de titularidade à vista da qual só se fará a inscrição de um direito se o outorgante dele aparecer no registro como seu titular. Assim, as sucessivas transmissões, que derivam umas das outras, asseguram sempre a preexistência do imóvel no patrimônio do transferente. Ao exigir que cada inscrição encontre sua procedência em outra anterior, que assegure a legitimidade da transmissão ou da oneração do direito, acaba por transforma-la no elo de uma corrente ininterrupta de assentos, cada um dos quais se liga ao seu antecedente, como o seu subsequente a ele se ligará posteriormente. Graças a isso o Registro de Imóveis inspira confiança ao público. (…) A sua essência repousa na necessidade de fazer com que o registro reflita com a maior fidelidade possível a realidade jurídica. Ao exigir-se que todo aquele que dispõe de um direito esteja inscrito como seu titular no registro, impede-se que o não titular dele disponha”, (grifei) [1].
Pois bem. Se a carta de adjudicação for registrada sem que averbada a extinção da antiga sociedade proprietária, plantar-se-á, indubitavelmente, uma lacuna no registro do imóvel em questão, ferindo o princípio de continuidade.
Por epítome, a recusa do Digno Oficial do Registro de Imóveis foi correta, porque a parte ré da ação de adjudicação compulsória não consta do Registro como sendo a proprietária do imóvel.

  1. Ante o exposto, pelo arrimo esposado, pelo meu voto, nego provimento ao recurso.

Ricardo Mair Anafe
Presidente da Seção de Direito Público
Nota: [1] Registro de Imóveis, 3ª edição, Rio de Janeiro: Forense, 1.982, p. 304/305.
(DJe de 29.04.2015 – SP)