CGJ|SP: Registro de Imóveis – Cisão de sociedade anônima – Pretendida averbação sem valor declarado – Expressa disposição, porém, enunciada na nota explicativa nº 2.1 da Tabela II da Lei nº 11.331/2002, de que se trata averbação com valor declarado – Recurso não provido.

Parecer 358/2009-E – Processo CG 2009/72363 
(358/2009-E)
REGISTRO DE IMÓVEIS – Cisão de sociedade anônima – Pretendida averbação sem valor declarado – Expressa disposição, porém, enunciada na nota explicativa nº 2.1 da Tabela II da Lei nº 11.331/2002, de que se trata averbação com valor declarado – Recurso não provido.
Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça:
Cuida-se de recurso interposto por AES Tietê S.A. contra decisão do Juízo da Corregedoria Permanente da Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Birigüi, pela qual foi mantida a recusa à averbação de cisão societária nas matrículas de imóveis registrados em nome da cindida (CESP – Companhia Energética de São Paulo), sob o fundamento de ser necessária a apresentação de Laudo de Avaliação dos bens, de Certificado de Cadastro do Imóvel Rural (CCIR) e de comprovação de pagamento do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR) nos últimos cinco exercícios.
Alega a recorrente que “a necessidade de apresentação do Laudo de Avaliação para permitir a valoração dos serviços do Cartório, além de se mostrar insustentável, contraria o disposto na doutrina e nos diplomas legais, conforme explicitado outrora. Como a exigência de tal apresentação cinge-se a permitir o cálculo, sua obrigatoriedade mostra-se atingida, vez que a averbação a ser praticada é na modalidade SEM VALOR” (fls. 255). Sustenta, outrossim, a “prescindibilidade de apresentação do CCIR e certidão negativa do ITR”, pois a situação em foco não se subsume ao disposto no art. 22, §§ 1º e 3º, da Lei nº 4.947/66, visto que não ocorrem as hipóteses ali previstas, mas, sim, cisão de sociedade. Além disto, os imóveis “perderam sua destinação rural”, porquanto destinados a atividade de geração de energia elétrica, e existem áreas alagadas, não consideradas para apuração de ITR por força do art. 10, § 1º, II, “f”, da Lei nº 9.393/96. Requer a reforma da decisão recorrida, para que se faça a averbação, nos moldes apontados (fls. 246/260).
O Ministério Público, depois de sublinhar a competência recursal da Corregedoria Geral da Justiça, afirmou que é “pertinente o reclamo”. Entende que o laudo de avaliação não é necessário, uma vez que, segundo o art. 234 da Lei das S.A., a certidão passada pelo Registro do Comércio “é documento hábil para a averbação”. Considera injustificada a “exigência de CCIR e ITR”. Posiciona-se pelo provimento (fls. 307/309).
Encaminhados os autos, inicialmente, ao E. Conselho Superior da Magistratura, foi determinada sua remessa a esta Corregedoria Geral, por se tratar de dissenso acerca de averbação (fls. 310/311).
Juntou a recorrente (fls. 314/323) novos documentos (cópias de parecer ministerial e decisão judicial em outro feito) e o Parquet reiterou sua anterior manifestação (fls. 328).
Relatei.
Passo a opinar.
Anoto que, em razão da natureza do presente procedimento, o recurso interposto, embora erroneamente rotulado de “apelação”, deve ser apreciado como administrativo (na forma do artigo 246 do Código Judiciário do Estado de São Paulo), cujo exame compete a esta Corregedoria Geral da Justiça.
De se principiar pela questão relativa à exigência de apresentação de CCIR e de comprovantes de pagamento de ITR.
Quanto às alegações de que os imóveis perderam sua destinação rural e de que se cogita de áreas alagadas, cumpre lembrar que tais circunstâncias não podem ser presumidas e que não se trata de fatos efetivamente provados. Logo, não consubstanciam matéria que possa ser levada em consideração no estrito âmbito do presente procedimento administrativo, ora em fase recursal.
Todavia, é correta a afirmação de que no art. 22, §§ 1º e 3º, da Lei nº 4.947/66, a hipótese dos autos (cisão de sociedade) não está prevista entre as que implicam exigência dos documentos citados:
“Art. 22 – A partir de 1º de janeiro de 1967, somente mediante apresentação do Certificado de Cadastro, expedido pelo IBRA e previsto na Lei n º 4.504, de 30 de novembro de 1964, poderá o proprietário de qualquer imóvel rural pleitear as facilidades proporcionadas pelos órgãos federais de administração centralizada ou descentralizada, ou por empresas de economia mista de que a União possua a maioria das ações, e, bem assim, obter inscrição, aprovação e registro de projetos de colonização particular, no IBRA ou no INDA, ou aprovação de projetos de loteamento.
§ 1º – Sem apresentação do Certificado de Cadastro, não poderão os proprietários, a partir da data a que se refere este artigo, sob pena de nulidade, desmembrar, arrendar, hipotecar, vender ou prometer em venda imóveis rurais.
§ 2º – Em caso de sucessão causa mortis nenhuma partilha, amigável ou judicial, poderá ser homologada pela autoridade competente, sem a apresentação do Certificado de Cadastro, a partir da data referida neste artigo.
§ 3o A apresentação do Certificado de Cadastro de Imóvel Rural – CCIR, exigida no caput deste artigo e nos §§ 1o e 2o, far-se-á, sempre, acompanhada da prova de quitação do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural – ITR, correspondente aos últimos cinco exercícios, ressalvados os casos de inexigibilidade e dispensa previstos no art. 20 da Lei no 9.393, de 19 de dezembro de 1996”.
Não se cuida, propriamente, de “desmembrar, arrendar, hipotecar, vender ou prometer em venda imóveis rurais”, casos que não se confundem com o de cisão societária. E, embora esta traga implicações patrimoniais, não equivale, pura e simplesmente, a ato de transferência direta de bens, tanto que seu ingresso no fólio real não se dá por meio de registro, mas, sim, de averbação.
Deveras, o art. 234 da Lei nº 6.404/64 (Lei das Sociedades Anônimas) é expresso nesse sentido:
“Art. 234. A certidão, passada pelo registro do comércio, da incorporação, fusão ou cisão, é documento hábil para a averbação, nos registros públicos competentes, da sucessão, decorrente da operação, em bens, direitos e obrigações”.
Note-se que tal dispositivo é de cunho especial. Nele – e não nos artigos 167 e 168 da Lei nº 6.015/73- é que se acha expressamente previsto o acesso tabular da cisão mediante ato específico de averbação.
Logo, era cabível a dispensa, quando da qualificação que foi levada a efeito, da exibição do CCIR e da prova de quitação do ITR.
Acertada, todavia, a exigência do Laudo de Avaliação, mesmo porque o fato da certidão do “registro do comércio” configurar “documento hábil para a averbação” (como também o é, por exemplo, a escritura pública no caso de compra e venda de imóvel) não significa, por óbvio, que se possa prescindir da observância dos requisitos impostos pela lógica da sistemática registrária imperante, nisto se incluindo o devido recolhimento dos emolumentos concretamente cabíveis.
Aliás, a efetiva existência do mencionado Laudo de Avaliação, além de prevista na Lei das Sociedades Anônimas, é diretamente mencionada na documentação trazida pela própria recorrente (cf., v.g., fls. 19 e 29).
Em decisão proferida no proc. nº 000.04.049033-5 da 1ª Vara de Registros Públicos da Capital, o então MM. Juiz, hoje Desembargador, Venício Salles, louvando-se em parecer de José de Mello Junqueira, já destacava: “Quanto aos documentos que devem ser apresentados para a devida averbação, são aqueles que efetivamente representam esta alteração patrimonial das sociedades. São, portanto, compostos pelo Protocolo de Justificação, que é o documento inicial do processo de incorporação, fusão e cisão, como didaticamente destacou o parecerista Dr. José de Mello Junqueira, acompanhado do LAUDO de avaliação do acervo patrimonial, e da certidão da JUNTA COMERCIAL que confere publicidade ao ato”.
Inviável acolher o argumento, trazido pela recorrente, de que a averbação em foco é daquelas “SEM VALOR” declarado e, portanto, não há “necessidade de apresentação do Laudo de Avaliação para permitir a valoração dos serviços do Cartório” (fls. 255).
Bem ao contrário, constata-se que, por categórica disposição legal, a notícia de cisão societária em matrícula de imóvel se faz por averbação com valor declarado.
Basta conferir o teor da nota explicativa nº 2.1 da Tabela II da Lei nº 11.331/2002, tal como vigente ao tempo da qualificação levada a efeito pela registradora: “De regra, considera-se a averbação com valor, somente aquela que implica em alteração de contrato, da dívida ou da coisa, do cancelamento de hipoteca, já constante do registro, bem como as conseqüentes de fusão, cisão ou incorporação de sociedades”. Grifei.
Logo, cogitando-se de averbação com valor declarado e sabendo-se que, em tal hipótese, a tabela de emolumentos é escalonada por faixas de valor, não podia, mesmo, no contexto em que recusado o ato pela Oficial e mantida a recusa pela r. decisão guerreada, ser dispensada a exibição do Laudo de Avaliação.
Imperioso, destarte, negar provimento ao recurso, uma vez que era, realmente, inviável a averbação pretendida nos termos defendidos pela interessada.
Ressalvo, porém, que, depois de prolatado o decisum recorrido (datado de 18/08/2008, cf. fls. 239), houve alteração legislativa, em conseqüência da qual a citada nota explicativa nº 2.1 da Tabela II da Lei nº 11.331/2002 ficou assim redigida: “Considera-se averbação com valor aquela referente à fusão, cisão ou incorporação de sociedades, cancelamento de direitos reais e outros gravames, bem como a que implica alteração de contrato, da dívida ou da coisa, inclusive retificação de área, neste caso tomando-se como base de cálculo o valor venal do imóvel” (nova redação dada pela Lei 13.290 de 22/12/2008).
No entanto, percebe-se que a cisão societária continuou a corresponder à hipótese de averbação com valor declarado, em oposição ao sustentado pela recorrente.
Diante do exposto, o parecer que submeto à elevada apreciação de Vossa Excelência, mui respeitosamente, é no rumo de que seja negado provimento ao recurso.
Sub censura.
São Paulo, 06 de novembro de 2009.
(a) JOSÉ ANTONIO DE PAULA SANTOS NETO
Juiz Auxiliar da Corregedoria
Decisão: Aprovo o parecer do MM. Juiz Auxiliar da Corregedoria e, por seus fundamentos, que adoto, nego provimento ao recurso interposto. Publique-se. São Paulo, 16 de novembro de 2009. (a) REIS KUNTZ – Corregedor Geral da Justiça.