TJ|RS: Divórcio direto – Viabilidade do pedido – Não obrigatoriedade do requisito temporal para extinguir a sociedade conjugal

EMENTA

DIVÓRCIO DIRETO. VIABILIDADE DO PEDIDO. NÃO OBRIGATORIEDADE DO REQUISITO TEMPORAL PARA EXTINGUIR A SOCIEDADE CONJUGAL. 1. A Emenda Constitucional nº 66 limitou-se a admitir a possibilidadede concessão de divórcio direto para dissolver o casamento, afastando a exigência, no plano constitucional, da prévia separação judicial e do requisito temporal de separação fática. 2. Essa disposição constitucional não retirou do ordenamento jurídico a legislaçãoinfraconstitucional, que continua regulando tanto a dissolução do casamento como da sociedade conjugal e estabelecendo limites e condições, permanecendo em vigor as disposições legais que regulamentam a separação judicial, como sendo a única modalidade legal de extinção da sociedade conjugal, que não afeta o vínculo matrimonial. 3. Com ressalva do entendimento pessoal de que somente com a modificação da legislação infraconstitucional é que a exigência relativa aos prazos legais poderia ser afastada, estou acompanhando o entendimento jurisprudencial dominante neste Tribunal de Justiça e admitindo abrandar a questão relativa aos prazos legais. Recurso provido. (TJRS – Agravo de Instrumento nº 70044638138 – Passo Fundo – 7ª Câmara Cível – Rel. Des. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves – DJ 02.09.2011)

DECISÃO MONOCRÁTICA

Trata-se da irresignação de ROGÉRIO R. C. e de ELIANA F. G. C. com a r. decisão que indeferiu o pedido de divórcio direto sob o argumento de que as partes não preenchem os requisitos exigidos pelo art. 1.580 do Código Civil, nos autos do ação de divórcio direto consensual por eles movida.

Sustentam os recorrentes que, com a Emenda Constitucional nº 66/2010, restou extinta a exigência da separação judicial prévia por mais de um ano ou da separação de fato por mais de dois anos para realização do divórcio. Dizem que, com a nova redação constitucional, o art. 226, § 6º, determinou que “o casamento civil pode ser dissolvido com o divórcio”, permitindo a extinção do vínculo matrimonial pelo divórcio, sem qualquer exigência. Pretendem a desconstituição da decisão recorrida, para que seja possibilitado o trâmite da ação pelo rito do divórcio, com a final decretação deste. Pedem seja dado provimento ao recurso. É o relatório.

Diante da singeleza da questão posta e dos elementos de convicção inequívocos, bem como da sólida orientação jurisprudencial desta Corte, passo ao julgamento monocrático consoante o permissivo do art. 557 do Código de Processo Civil. E adianto que a irresignação merece ser acolhida.

Inicialmente cumpre tecer algumas considerações acerca da questão posta no recurso, já adiantando que estou acompanhando o entendimento jurisprudencial dominante neste Tribunal de Justiça e admitindo abrandar a questão relativa aos prazos legais, mas faço questão de ressalvar, no plano teórico, o meu entendimento pessoal de que somente com a modificação da legislação infraconstitucional é que a exigência relativa aos prazos legais poderia ser afastada.

Essa mudança de entendimento decorre do fato de que a jurisprudência desta Corte tem se firmado na direção do abrandamento dos prazos e, em primeiro grau, tem sido esta, de forma dominante a linha de entendimento. Assim, nome da segurança jurídica e para afastar decisões discrepantes, que são pouco edificantes, estou revisando o meu entendimento.

Ainda assim, peço vênia para deixar claro o meu entendimento teórico acerca dessa questão.

Com efeito, a Emenda nº 66 não alterou a legislação infraconstitucional, apenas abriu espaço para o legislador promover as alterações que entender necessárias. Ou seja, a Emenda Constitucional nº 66 limitou-sea admitir a possibilidadede concessão de divórcio direto para dissolver o casamento, afastando a exigência, no plano constitucional, da prévia separação judicial e do requisito temporal de separação fática. E não foi além disso…

Portanto, essa disposição constitucional evidentemente não retirou do ordenamentojurídico a legislaçãoinfraconstitucional que continua regulando tanto a dissolução do casamento como da sociedade conjugal e estabelecendo limites e condições, permanecendo em vigor todas as disposições legais que regulamentam a separação judicial, como sendo a única modalidade legal de extinção da sociedade conjugal, que não afeta o vínculo matrimonial. Assim sendo, somente com a modificação da legislação infraconstitucional é que a exigência relativa aos prazos legais poderia ser afastada.

Poderia, sem dúvida, discorrer de forma mais pormenorizada acerca do equívoco cometido por aqueles que entendem que a referida emenda tenha suprimido do ordenamento jurídico pátrio o instituto da separação judicial ou afastada a exigência de prazos legais, mas penso que a matéria tem sido tratada com peculiar brilho por eminentes Colegas, cujos argumentos vou reproduzir adiante. E nesse momento em que estou revisando o meu entendimento, penso que seria pouco edificante alargar ainda mais tal discussão.

Destaco, por oportuno, o entendimento esposado pelo eminente DESEMBARGADOR LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS que focaliza essa questão de forma brilhante, rigorosamente técnica e com suporte na melhor hermenêutica, sendo oportuno reproduzir o seu excelente artigo intitulado “EC nº 66/2010: É cedo para comemorar”, que examina com objetividade a questãoposta e cujos argumentos peço vênia transcrever, in verbis:

Em vigor desde 14 de julho último, a Emenda Constitucional 66/2010 alterou a redação do parágrafo 6º do artigo 226 da Constituição Federal, retirando do texto a referência à separação judicial e aos requisitos temporais para a obtenção do divórcio.

Ao fazê-lo, suscitou natural perplexidade entre os operadores do Direito, que se indagam acerca da imediata extinção do instituto da separação judicial e da possibilidade, agora, de obter o divórcio sem que seja exigido qualquer tempo de separação de fato ou de separação judicial.

Como costuma ocorrer em ocasiões como esta, opiniões há em ambos os sentidos. É preciso, pois, neste momento, extrema cautela na análise técnica e desapaixonada da questão. Vejamos.

Atente-se que qualquer norma será formalmente constitucional pelo só fato de constar na Constituição Federal. Porém, nem todas as normas formalmente constitucionais são também materialmente constitucionais. Os dispositivos apenas formalmente constitucionais são denominados por alguns autores de lei constitucional. São regras que, por sua natureza, não precisariam constar da Constituição, mas lá são colocadas por razões de simples conveniência política. É como se fosse uma lei inserida no corpo da Constituição. Uma lei travestida de Constituição. Nossa Carta Magna é notoriamente pródiga em normas constitucionais em sentido apenas formal. Os exemplos são até dispensáveis e não caberiam em um texto resumido como este.

É esse exatamente o caso do texto modificado pela EC 66/2010. Uma breve retrospectiva histórica auxiliará na compreensão do que aqui se sustenta.

O casamento civil somente foi implantado em nosso país no ano de 1890, pelo Decreto 181, de 24.01.1890, que não tratava da dissolução do vínculo, prevendo apenas a separação de corpos (divórcio canônico). No Código Civil de 1916 foi introduzido o desquite, como forma de pôr fim à sociedade conjugal, mantendo íntegro o vínculo. Até então, sinale-se, o tema da extinção da sociedade conjugal não tinha sido alçado à dignidade constitucional. Nossa primeira Constituição a dispor acerca dessa matéria foi a de 1934, que, no artigo 144, erigiu a princípio constitucional a indissolubilidade do vínculo matrimonial, como estratégia para dificultar a introdução do divórcio em nosso país, acrescentando, no parágrafo único, que “A lei civil determinará os casos de desquite e de anulação de casamento (…)”.

A Constituição de 1937, porém, em seu artigo 124, embora tenha mantido o princípio da indissolubilidade, calou acerca do desquite, que, no entanto, permanecia previsto no Código Civil. O mesmo ocorreu com a Carta de 1946, com a Carta outorgada de 1967 (artigo 167) e com a Emenda Constitucional 01/69: preservação do princípio da indissolubilidade do vínculo e silêncio completo acerca do desquite, que, como notório, sobrevivia soberanamente apenas na legislação ordinária (Código Civil de 1916).

Ao que se saiba, na época, ninguém sustentou a tese de que, pela circunstância de que a Constituição deixara de contemplar o desquite dentre seus dispositivos, esse instituto fora abolido. E isso pela singela razão de que o desquite continuava previsto no Código Civil. E isso bastava!

Somente em1977 aEmenda Constitucional 09/77 retirou da Constituição o princípio da indissolubilidade do vínculo, possibilitando a introdução do divórcioem nosso país. Noentanto, como parte do pacto político então firmado entre divorcistas e antidivorcistas, o parágrafo 1º do artigo 175 estabeleceu, em contrapartida, como condição para a obtenção do divórcio a existência de prévia separação judicial por, no mínimo, três anos. Ou seja: o divórcio somente poderia ser obtido transcorrido esse lapso temporal e por conversão da separação judicial. E, dispondo assim a Constituição, assegurava-se que a lei ordinária não poderia regrar diferentemente, risco que os antidivorcistas não queriam correr! Essa a razão para, a partir de então, ter sido reintroduzida na Constituição Federal — como norma apenas formalmente constitucional, frise-se — a menção à separação judicial e às condições para a obtenção do divórcio: nada mais do que um dispositivo de segurança para as correntes conservadoras.

Por aí se vê que a eliminação da referência constitucional aos requisitos para a obtenção do divórcio não significa que aquelas condicionantes tenham sido automaticamente abolidas, mas apenas que, deixando de constar no texto da Constituição, e subsistindo exclusivamente na lei ordinária (Código Civil) — como permaneceram durante 40 anos, entre 1937 e 1977 —, está agora aberta a porta para que esta seja modificada.

Tal modificação é imprescindível e, enquanto não ocorrer, o instituto da separação judicial continua existente, bem como os requisitos para a obtenção do divórcio. Tudo porque estão previstos em lei ordinária, que não deixou de ser constitucional. E isso basta!

Contenhamos um pouco, pois, nosso entusiasmo com a Emenda Constitucional 66/2010. Ela é, sem dúvida, extremamente importante, mas um próximo e indispensável passo necessita ser dado para que se alcance o objetivo de eliminar os entraves legais ao exercício da liberdade no seio das famílias, extirpando institutos anacrônicos como a separação judicial.

Também o ilustre Colega JUIZ DE DIREITO GILBERTOSCHAFER focalizou com maestria a questãono seu artigo intitulado “A emenda Constitucional nº 66 e o Divórcio no Brasil”, in verbis:

Por que a matéria foi constitucionalizada?

No Império, o casamento era regulado no Código Canônico em que o vínculo válido – para o inválido, havia a possibilidade de anulação — era indissolúvel, porém havia algo intermediário entre uma “separação de corpos” e uma separação (judicial). Essa forma, que se denominou divórcio quod thorum et cohabitationem, uma espécie de separação, porque não dissolvia o casamento, grassou no Dec. 1.144/1861.

No Código Civil de 1916 houve a inserção de uma possibilidade de ampliação da dissolução: o desquite (amigável ou judicial), palavra esta que, devido ao preconceito religioso e social da época, se tornou pejorativa.

O medo de que esta forma de dissolução da sociedade conjugal – o desquite – evoluísse para o divórcio fez com que na Constituição de 1934[1] a matéria fosse constitucionalizada para que este grau de hierarquia e de rigidez dificultasse a introdução da dissolução do casamento. Temia-se que a eleição de um Parlamento com um certo grau de independência em relação a pressões religiosas pudesse aprovar o divórcio.

Esta redação de 1934, com pequenas mudanças, foi repetida pelas Constituições de 1937[2], 1946[3] e 1967[4] (mantida pela EC de 1969).

A pressão social – pelos motivos que conhecemos bem, apesar da resistência e das hipocrisias da época, retratadas na Literatura por Josué Guimarães, em sua obra Dona Anja – fez com que, em 1977, fosse aprovada e promulgada a EC n. 9, admitindo a possibilidade da dissolução conjugal:

Art. 1 º: O §1º do art.175 da Constituição Federal passa a vigorar com a seguinte redação: o casamento somente poderá ser dissolvido nos casos previstos em lei, desde que haja prévia separação judicial por mais de 3 anos.

Art. 2: A separação, de que trata o §1º do art.175 da Constituição Federal poderá ser de fato, devidamente provada em juízo, e pelo prazo de 5 anos, se for anterior a data dessa emenda.

Traço interessante desta EC é que ela não usava o termo divórcio, ou seja, a Emenda do Divórcio não usava a própria palavra. A Emenda foi regulamentada pela Lei n. 6.515, de 26 de dezembro de 1977, que institui o divórcio no Brasil e que utilizou expressamente o termo divórcio. Vale referir que as modificações posteriores da Lei n. 6.515 consagraram as duas formas de se chegar ao divórcio: direta (que antes era apenas uma regra de transição no texto constitucional) e por conversão.

A palavra divórcio — um instituto de Direito Civil — aparece pela primeira vez em um texto constitucional em 1988, no § 6 º do artigo 226, com as duas formas possível de chegar até ele (direto e por conversão): “O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio, após prévia separação judicial por mais de um ano nos casos expressos em lei, ou comprovada separação de fato por mais de dois anos”.

A redação dada pela Emenda Constitucional n. 66, de 2010

A EC n. 66, que reformou § 6º, objeto desta análise, está assim redigida: “o casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio”. Este texto alberga (1) o princípio de que o casamento é dissolúvel e (2) uma regra, a saber, de que o casamento pode ser dissolvido pelo divórcio.

O princípio (1) não está aqui em questão, porque desde 1977, adotado entre nós. A regra (2), contudo, comporta discussões sobre o seu alcance. Podemos, resumir, a partir do painel realizado pela ESM/AJURIS, do qual participei, as posições a respeito da matéria [5]:

(a) O texto contém uma norma com eficácia constitucional mediata e apenas desconstitucionalizou a matéria [6];

(b) O texto contém uma norma com eficácia constitucional imediata, direta e revogou o direito infraconstitucional, incompatível com o divórcio a qualquer tempo, revogando, inclusive, a separação judicial[7];

(c) Formou-se ainda uma corrente mista ou eclética que sustenta que continuam em vigor as regras da separação, que seguem o Código Civil. Quanto ao divórcio há incidência imediata, podendo ser requerido de forma direta a qualquer tempo[8]. Tal posição (c) apresenta uma variante, que podemos expressar em (c1): a separação continua existindo, mas sem qualquer limite temporal.

O nosso texto defende a concepção expressa em (a) de que o texto constitucional tem aplicabilidade mediata e apenas desconstitucionalizou a matéria.

Para este ponto de vista, é fundamental levar em conta que a Constituição continua fazendo referência a um instituto de direito civil: o divórcio. Isto significa que não podemos compreender o texto constitucional sem recorrermos ao direito civil, ou seja, é em virtude do direito civil que sabemos o que é o divórcio, quais são as suas modalidades e quais são os seus requisitos. Além de regras de direito material, o instituto possui regras processuais próprias, inserindo-se no conceito de leis especiais que tem regulamentação de direito material e adjetivo.

Conforme explica Humberto Ávila[9]:”A previsão de conceitos constitucionais pode ser feita de duas formas. De um lado, de modo direto, nos casosem que a Constituição já enuncia expressamente as propriedades conotadas pelos conceitos que utiliza. De outro, de modo indireto, nas situaçõesem que o Poder Constituinte, ao escolher expressões cujas propriedades já eram conotadas em conceitos elaborados pelo legislador infraconstitucional à época da promulgação da Constituição opta por incorporá-los ao ordenamento constitucional. Em qualquer hipótese a Constituição fixa balizas que não podem ser ultrapassadas pelo legislador ordinário sob a sua vigência”. Quanto se utiliza uma palavra, em um instituto não se pode desprezar, em conseqüência este conteúdo.

Mesmo que se admita tratar-se de uma norma de eficácia contida ou restringível[10], o emprego de um conceito geral, como é o caso do divórcio, enunciado na Constituição, permite a atuação do legislador que pode adaptar o instituto a novas conformações sociais, de acordo com a realidade política e social[11]. Note-se, no entanto, que o legislador já tinha atuado, motivo pelo qual a cláusula de contenção já funcionou antecipadamente e não pode ser ignorada pelos intérpretes.

O fato de eliminar requisitos, portanto, não significa a revogação do direito infraconstitucional[12]. Mais do que nunca, a EC n. 66 significa uma grande mudança: não há mais requisitos constitucionais para o divórcio, ou seja, há a liberdade de o legislador dispor sobre o assunto.

Pode-se objetar com o argumento à Duns Scott (argumentatio ad absurdum[13]) de que, se esta tese fosse verdadeira, então, o legislador poderia colocar como parâmetro, por exemplo, cinco anos de separação de fato para o divórcio poder ser decretado. Realmente não há argumentos que possam ser construídos somente a partir do Texto da EC que possa impedir esta escolha do legislador. Entretanto, eu considero que algumas normas constitucionais certamente poderiam barrar esta interpretação, como, por exemplo:a) a razoabilidade das leis; b) a proporcionalidade; c) a proteção à família (leiam-se: famílias); d) a dignidade da pessoa humana; e) a vedação de retrocesso social. Deste modo, esta objeção pode ser eliminada, empregando-se uma interpretação sistemática.

A eliminação de requisitos constitucionais significa liberdade de atuação para o legislador que pode dispor a respeito do término do casamento pelo divórcio, conformando requisitos e procedimentos.

Há outros casos em que houve desconstitucionalização[14] e que continuou sendo aplicado o direito infraconstitucional?

O que estamos dizendo até aqui é que a retirada de parâmetros constitucionais, na matéria de Direito Civil, significa desconstitucionalização, ou seja, ocorre a perda de hierarquia constitucional para que a matéria seja regulada em plano infraconstitucional. Retirardo Texto Constitucional não significa revogação, especialmente quando a matéria está regulada no plano ordinário. E este é justamente o ponto pelo qual não se demonstra a existência de uma revogação. Exemplo deste fenômeno ocorreu, em relação ao próprio casamento, pois a Constituição de 1937 retirou do seu texto o recurso ex officio, previsto no Artigo 144 da Constituição de 1934,[15] para os casos de desquite e de anulação de casamento.

Pontes de Miranda analisa justamente este caso de desconstitucionalização para afastar efeito revogatório: “A Constituição de 1937 entendeu que seria impróprio do texto constitucional conter regra jurídica processual de tal pormenor; e riscou dos seus artigos o parágrafo único do art. 144 da Constituição anterior. Isso não quer dizer que, desde 10 de novembro de 1937, revogado ficasse o direito correspondente. A regra jurídica continuou, como de direito ordinário, suscetível, portanto, de derrogação e ab-rogação pelos legisladores ordinários. O que lhe cessou foi a fôrça de princípio jurídico constitucional”[16].

E a vontade do “legislador constituinte”?

Um dos focos da argumentação em prol da posição (b) reside na chamada vontade do constituinte. O legislador constituinte, através da mídia, veiculou a concepção de facilidade e de rapidez para atingir o divórcio.

É certo que já se amainaram as críticas ao processo de valorização da gênese legislativa, aí incluídos os chamados trabalhos parlamentares (travaux parlamentaire), mas não há a possibilidade de se ultrapassar os limites da linguagem, sob pena de perder qualquer objetividade na interpretação[17]. E o perigo de não equilibrar subjetividade/objetividade é a possibilidade do arbítrio e da falta de controle e até mesmo em um excesso de voluntarismo que não pode mais ser aceito. É a linguagem do texto expresso na EC que deve nos dar a justa medida para a sua interpretação.

Talvez em uma questão em que nossa tábua moral esteja de acordo — sou favorável à medida —seja sempre um bom teste para a forma como lidamos com a “lei”, aqui concebidaem sentido lato. Otexto constitucional não permite esta aplicação, a não ser naqueles casos em que o próprio direito infraconstitucional permitia a conversão antecipada, como o decurso de prazo de separação de fato ou de corpos no decorrer do processo judicial. Isto é especificação da separação de poderes, preceito fundamental, em que as tarefas do juiz não se confundem com as do legislador.

Não haveria qualquer discussão caso a EC estivesse redigida nos seguintes termos: “O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio que será requerido de forma direta a qualquer tempo, por um ou ambos ou cônjuges”.

Outros princípios constitucionais de interpretação não podem socorrer a hipótese que não esteja em (a), seja pela presunção relativa de constitucionalidade — as normas infraconstitucionais não podem ser descartadas sem uma avaliação rigorosa —, seja porque o legislador deve dar a medida da dissolução do casamento, como tarefa sua, inerente à separação de poderes. Tampouco se pode argumentar que se olvida o princípio da máxima efetividade constitucional, porquanto se trata aqui de estabelecer o campo de aplicação normativo[18], cuja eficácia é mediata e plena, porque o instituto não é novo, já está regrado.

Há quem defenda que o “o direito de estar ou não casados não pertence mais ao Estado, mas sim às pessoas envolvidas nessa relação de afeto[19]“. É bem verdade que existe um grande espaço de liberdade individual na vida afetiva, mas o casamento é exercido conforme as prescrições legais: é, pois, um ato estatal[20]. E como ato estatal, tem a regulamentação na forma da lei, seja para casar, seja para “descasar”.

Vamos analisar ainda outras questões:

Aceita a tese do divórcio direto (sem conversão), isso significa que acabou a separação judicial ou extrajudicial?

Parece-me que aceitar a eficácia direta da dissolução do casamento pelo divórcio, sem qualquer requisito, não significa aceitar que a separação – judicial ou extrajudicial – foi abolida. Portanto, não se pode aceitar (b). A separação, enquanto não abolida pelo legislador, pode ser utilizada por todas as pessoas que não queiram se divorciar por motivos religiosos, por esperança de voltar a conviver juntos, porque ela admite restabelecimento da sociedade conjugal.

No entanto, (c) também apresenta problemas, pois, aceita a tese da aplicabilidade direta do divórcio, sem prazo, não haveria a necessidade de prazo para a separação. Então a única possibilidade a se admitir, para não se chegar a resultados incongruentes, é (c1).

Há um instrumento constitucional que permita resolver a questão?

No caso de se apresentar uma divergência relevante a respeito da aplicabilidade da EC 66, é possível propor, através dos legitimados do Art. 103 da CF, a Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental. A argüição serviria justamente para tutelar o preceito fundamental da segurança jurídica, em que um dos vetores é a previsibilidade, que atingirá diretamente os interesses da cidadania. Assim, de acordo com o entendimento firmado pelo STF na ADPF n. 33 e n. 130, é possível antecipar de forma direta e geral o alcance deste texto constitucional.

A segurança jurídica deve ser aqui um vetor indispensável para resolver os casos pois na hipótese de que viesse a ser reconhecida a tese (a), os casos decididos conforme (b), (c) e (c1) ficam sujeitos às regras de preclusão e não podem ser declarados nulos, sob pena de gerar grave insegurança jurídica[21].

De qualquer forma, há que se registrar que do ponto de vista político se espera que o Congresso Nacional faça o que anunciou: facilitar a dissolução do casamento pelo divórcio, mudando o Código Civil.

Finalmente, também o eminente jurista, professor e DESEMBARGADOR SÉRGIO GISCHKOW PEREIRA comunga do mesmo entendimento, como se vê do excelente artigo de sua autoria, amplamente divulgado, cujo título é bastante expressivo, “Calma com a Separação e o Divórcio!”, in verbis:

É primário que as leis se sujeitam às divergências de interpretação. Mas há limites para o voluntarismo interpretativo. Sempre fui pela simplificação do divórcio, de molde a ser obtido sem necessidade de prazos ou de prévia separação judicial. Porém, parece-me que estão sucedendo equívocos por excesso de entusiasmo com a alteração constitucional (art. 226, § 6°), que não mais contempla, para o divórcio, os requisitos de prévia separação judicial por um ano ou separação de fato por dois anos.

Os sintomas de reação aparecem. Tabelionatos hesitam em ter como afastada a separação e em ignorar aqueles prazos, e profissionais do Direito divergem sobre o alcance da reforma constitucional.

Os equívocos dos entusiastas são dois: a) entender que a separação judicial (e também a extrajudicial) desapareceu; b) afirmar peremptoriamente que as exigências anteriores para o divórcio já foram eliminadas.

A Constituição Federal não tratava da separação judicial, mas somente do divórcio. A separação judicial apenas foi elidida como exigência para o divórcio, mas permanece no sistema brasileiro, enquanto não revogado o Código Civil. Muitos pensam assim. A Constituição fala que o casamento é dissolvido pelo divórcio; ora, a separação não dissolve casamento, mas sim a sociedade conjugal. Alguns asseveram que ela é inútil. Não é bem assim. Desde que não atrapalhe o divórcio, pode continuar no Código Civil. A verdade é que pode ser o único caminho para aqueles cuja religião não admite o divórcio.

A Constituição, ao nela constar que o casamento pode ser dissolvido pelo divórcio, não especifica requisitos, com o que sustentável que continuem regidos pelo Código Civil (não concordo, mas vários assim pensam). As dúvidas se multiplicam em um tema que atinge milhões de pessoas.

O mais recomendável é que de imediato se altere o Código Civil, retirando dele, se for o caso, a separação judicial (e, do Código de Processo, a extrajudicial), eliminando os requisitos de prazo para divórcio e definindo se a discussão de culpa permanece ou não. Não agir assim é provocar grande tumulto e divergências, tendo como resultado muito maior demora nos processos e o risco de futura epidemia de nulidades e carências de ação em milhares deles! O povo merece maior consideração!

E afirmo ser este o meu entendimento, no plano doutrinário.

No entanto, consoante posição jurisprudencial dominante neste egrégio Tribunal de Justiça, é possível promover o divórcio direito, independentemente do prazo, conforme se vê das ementas que abaixo transcrevo:

APELAÇÃO CÍVEL. DIVÓRCIO. EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 66. ALIMENTOS. BINÔMIO NECESSIDADE/POSSIBILIDADE. Divórcio. A Emenda Constitucional n.º 66 afastou a necessidade de prévia separação ou decurso de prazo para a decretação do divórcio direto. Precedentes jurisprudenciais. Ademais, ainda que não fosse o caso de aplicação da EC 66, os elementos nos autos estão a indicar que as partes se encontram separadas de fato há mais de 04 anos. Assim, não existe qualquer impedimento para a decretação do divórcio. Alimentos. Ainda que haja uma certa carência de provas acerca das possibilidades do alimentante, não parece crível que ele disponha de rendimentos suficientes para arcar com o valor pretendido pela alimentada. Cabível a majoração do valor do pensionamento, mas não no patamar pleiteado pela alimentada. DERAM PARCIAL PROVIMENTO. (Apelação Cível Nº 70043307370, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rui Portanova, Julgado em 18/08/2011)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. EMENDA CONSTITUCIONAL N.º 66. DIVÓRCIO. Pela entradaem vigor da Emenda Constitucionaln.º 66, não há mais necessidade de prévia separação ou decurso de prazo para a decretação do divórcio direto. Precedentes jurisprudenciais da 7ª e da 8ª Câmaras Cíveis deste TJRS. AGRAVO PROVIDO.EM MONOCRÁTICA. (Agravode Instrumento Nº 70044500353, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rui Portanova, Julgado em 18/08/2011)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONVERSÃO DE SEPARAÇÃOEM DIVÓRCIO. EMENDA CONSTITUCIONAL N° 66/2010. NOVA REDAÇÃO DADA AO ART. 226, § 6°, DA CF/88 QUE ELIMINA OS REQUISITOS À SUA DECRETAÇÃO ANTERIORMENTE PREVISTOS. Com o advento da EC n° 66/2010 não mais subsistem os pressupostos da separação de fato por mais de dois anos ou da separação judicial por mais de um ano para a decretação do divórcio, bem como de antecedente partilha de bens do casal. Precedentes jurisprudenciais. AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO. (Agravo de Instrumento Nº 70043571033, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ricardo Moreira Lins Pastl, Julgado em 18/08/2011)

APELAÇÃO CÍVEL. FAMÍLIA. CASAMENTO. DIVÓRCIO DIRETO CONSENSUAL. APLICAÇÃO IMEDIATA DA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 66/2010. POSSIBILIDADE. DESNECESSIDADE DE EMENDA À INICIAL. NORMA DE EFICÁCIA PLENA E IMEDIATA, SENDO DESNECESSÁRIA REGULAMENTAÇÃO POR LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL. APELAÇÃO PROVIDA. (Apelação Cível Nº 70041954355, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator:Roberto Carvalho Fraga, Julgado em 27/07/2011)

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE DIVÓRCIO DIRETO. PRELIMINAR. Encerrada a instrução sem que a ré tenha requerido a produção de qualquer outra prova, embora intimada para tal, inexiste nulidade do feito, por ter sido apreciado o pedido de quebra do sigilo bancário do autor, somente na sentença. Aplicação do art. 245 do CPC. Preliminar rejeitada. EMENDA CONSTITUCIONAL N.º 66. DESNECESSIDADE DO IMPLEMENTO DE REQUISITOS PARA O DIVÓRCIO. A nova redação dada ao § 6º do art. 226 da Constituição Federal pela Emenda Constitucional n.º 66 possui eficácia plena e imediata. Embora a norma não tenha eliminado do ordenamento jurídico o instituto da separação judicial, que continua sendo instrumento hábil de dissolução da sociedade conjugal, não mais se pode exigir, para o divórcio, o implemento de prazos ou condições. Revogação do lapso temporal de separação judicial ou de fato, como exigência para a decretação do divórcio direto. PARTILHA. VERBA TRABALHISTA. Incabível a partilha entre os divorciandos de verbas trabalhista recebidas pelo varão, se ausente acordo nesse sentido, ainda que o período aquisitivo tenha se dado na vigência do casamento, mormente considerando-se que o crédito trabalhista foi recebido pelo réu após a separação do casal. Aplicação do artigo 263, XIII, do Código Civil de 1916, em razão da data da celebração do casamento. Precedentes. REJEITARAM A PRELIMINAR E DESPROVERAM A APELAÇÃO. (SEGREDO DE JUSTIÇA) (Apelação Cível Nº 70041084419, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator:André Luiz PlanellaVillarinho, Julgado em 13/07/2011)

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE DIVÓRCIO. EMENDA DA INICIAL. DESCABIMENTO. APLICAÇÃO DA EMENDA CONSTITUCIONAL N. 66/2010. A Emenda Constitucional n. 66/2010 deu nova redação ao § 6º do art. 226 da Constituição Federal estabelecendo que “O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio”, suprimindo os requisitos de prévia separação judicial por mais de um ano ou de separação de fato por mais de dois anos. Possibilidade de dissolução do casamento pelo divórcio independente de prazo de separação prévia do casal. Apelação provida, de plano. (Apelação Cível Nº 70041843079, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Luís Dall’Agnol, Julgado em 30/06/2011)

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE DIVÓRCIO CUMULADA COM GUARDA E ALIMENTOS. SENTENÇA DE EXTINÇÃO DO FEITO. EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 66. DESNECESSIDADE DO IMPLEMENTO DE REQUISITOS PARA O DIVÓRCIO. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA. A nova redação dada ao § 6º do art. 226 da Constituição Federal pela Emenda Constitucional n.º 66 possui eficácia plena e imediata. Embora a norma não tenha eliminado do ordenamento jurídico o instituto da separação judicial, que continua sendo instrumento hábil de dissolução da sociedade conjugal, não mais se pode exigir, para o divórcio, o implemento de prazos ou condições. Sentença desconstituída. APELAÇÃO PROVIDA. VENCIDO O PRESIDENTE, QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECURSO. (Apelação Cível Nº 70040278426, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator:André Luiz PlanellaVillarinho, Julgado em 29/06/2011)

DIVÓRCIO DIRETO, GUARDA E ALIMENTOS À FILHA MENOR. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE, CERCEAMETNO DE DEFESA INOCORRENTE. HIPÓTESEEM QUE O DEMANDADO, CITADO PESSOALMENTE, NÃO OFERTOU CONTESTAÇÃO, MANTENDO-SE INERTE. PROSSEGUIMENTO DA AÇÃO DEDUZIDO PELA AUTORA, DISPENSANDO A PRODUÇÃO PROBATÓRIA. DIVÓRCIO DO CASAL DECRETADO ANTE A COMPROVAÇÃO DA SEPARAÇÃO FÁTICA POR PERÍODO SUPERIOR A DOIS ANOS. REQUISITO TEMPORAL, ALIÁS, PRESCINDÍVEL, FACE À NOVA REDAÇÃO DO ART. 226, § 6º, DA CF, COM O ADVENTO DA EC Nº 66/2010. REGULARIZAÇÃO DA GUARDAEM FAVOR DA MÃE, COM A LIVRE VISITAÇÃO PATERNA, E FIXAÇÃO DE ALIMENTOS À FILHA NO MONTANTE QUE VINHA SENDO ALCANÇADO VOLUNTARIAMENTE PELO GENITOR. PREJUÍZO ÀS PARTES NÃO IDENTIFICADO. IMPRESCINDIBILIDADE DE REABERTURA DA INSTRUÇÃO PROBATÓRIA. AÇÃO PROCEDENTE, DECISÃO CONFIRMADA. APELAÇÃO DESPROVIDA. (Apelação Cível Nº 70037359692, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Ari Azambuja Ramos, Julgado em 02/09/2010)

Diante dessa linha de entendimento dominante nesta Corte, em nome da segurança jurídica e com ressalva do meu entendimento teórico acerca da matéria, estou acompanhando o entendimento jurisprudencial deste Tribunal de Justiça e admitindo abrandar a questão relativa aos prazos legais. Ou seja, mantendo incólume a legislação infraconstitucional quanto ao mais, estou afastando os prazos legais (e a prévia separação judicial) para a concessão do divórcio direto.

ISTO POSTO, em decisão monocrática, dou provimento ao recurso.

Porto Alegre, 29 de agosto de 2011.

DES. SÉRGIO FERNANDO DE VASCONCELLOS CHAVES – Relator.


Notas

[1] Art. 144 – A família, constituída pelo casamento indissolúvel, está sob a proteção especial do Estado. Parágrafo único – A lei civil determinará os casos de desquite e de anulação de casamento, havendo sempre recurso ex officio, com efeito suspensivo.

[2] Art. 124- A família, constituída pelo casamento indissolúvel, está sob a proteção especial do Estado. Às famílias numerosas serão atribuídas compensações na proporção dos seus encargos.

[3] Art. 163- A família é constituída pelo casamento de vínculo indissolúvel e terá direito à proteção especial do Estado. § 1º – O casamento será civil, e gratuita a sua celebração. O casamento religioso equivalerá ao civil se, observados os impedimentos e as prescrições da lei, assim o requerer o celebrante ou qualquer interessado, contanto que seja o ato inscrito no Registro Público. § 2º – O casamento religioso, celebrado sem as formalidades deste artigo, terá efeitos civis, se, a requerimento do casal, for inscrito no Registro Público, mediante prévia habilitação perante a autoridade competente.

[4] Art. 167- A família é constituída pelo casamento e terá direito à proteção dos Poderes Públicos. § 1º – O casamento é indissolúvel. § 2º – O casamento será civil e gratuita a sua celebração. O casamento religioso equivalerá ao civil se, observados os impedimentos e as prescrições da lei, assim o requerer o celebrante ou qualquer interessado, contanto que seja o ato inscrito no Registro Público. § 3º – O casamento religioso celebrado sem as formalidades deste artigo terá efeitos civis se, a requerimento do casal, for inscrito no Registro Público mediante prévia habilitação perante, a autoridade competente.

[5]João Pedro Lamana Paiva foi o mediador do debate. Os painelistas foram Luiz Felipe Brasil Santos, Maria Berenice Dias, Ney Paulo de Azambuja e Gilberto Schäfer que debateram as vantagens e as desvantagens acerca das alterações da Emenda n. 66 bem como as suas repercussões no âmbito do Direito de Família, Notarial e Registral. A sistematização segue a proposta apresentada no encontro pelo Des. Luiz Felipe Brasil Santos.

[6] Neste sentido a posição de Luiz Felipe Brasil Santos, Emenda do divórcio: cedo para comemorar. Disponível em: <http://magrs.net/?p=14055#more-14055>. Daniel André Köhler Berthold, O divórcio ficou mais rápido?, disponível em http://www.espacovital.com.br/noticia_ler.php?id=19644. Registra dúvida a respeito da matéria Sérgio Gischkow Pereira: “b) A Constituição, ao nela constar que o casamento pode ser dissolvido pelo divórcio, não especifica requisitos, com o que sustentável que continuem regidos pelo Código Civil (não concordo, mas vários assim pensam). As dúvidas se multiplicam em um tema que atinge milhões de pessoas” , in Calma com a separação e o divórcio!, disponível em http://magrs.net/?p=13910.

[7] Ver: DIAS, Maria Berenice. Enfim, o fim da separação! Disponível em:<http://magrs.net/?p=13907>

[8] Esta parece ser a posição do Colégio dos Notários, expresso em seu site, na nota Divórcio, disponível em:<http://www.colegionotarialrs.org.br/site/index.php?option=com_content&view=article&id=611:divorcio&
catid=58:colegio-notarial-do-brasil-secao-rs-&Itemid=187> em que consta: “Tomando por base a Emenda Constitucional 66 de 13/07/2010 e respeitando os requisitos da Lei 11.441/07, na lavratura de escritura pública de divórcio direto não é mais necessário exigir comprovação de lapso temporal nem a presença de testemunhas. Já para lavratura de escritura pública de separação consensual, nada muda, sendo necessário observar o prazo referido no art. 1.574 do Código Civil Brasileiro” . Recebeu também o apoio de Sérgio Gischkow Pereira, em Calma com a separação e o divórcio!, em <http://magrs.net/?p=13910>, mas que não se pronuncia no que diz respeito às formulações (c) e (c1).

[9] ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 5. ed. p. 112.

[10] O termo restringível é de TEMER, Michel. Elementos de Direito Constitucional. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2001.

[11] Ver SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais, Malheiros Editores, p. 116.

[12] A revogação é um passo não-demonstrado pelos que formulam (a) ou (c), ou seja, não levam em consideração a existência de planos diferentes neste caso (plano constitucional e infraconstitucional.

[13] A redutio ad absurdum recebeu esse denominação por Duns Scott na Idade Média. Conforme explica Wesley C Salmon, ela “constitui uma forma válida de argumento, largamente empregada e sumamente eficaz. É usada, algumas vezes, para estabelecer uma conclusão positiva; a ela recorre-se com freqüência para refutar a tese defendida pelo oponente. A idéia que motiva esta forma de argumento é muito simples. Suponha-se que desejemos provar que um enunciado p é verdadeiro. Começamos por supor que p é falso; ou seja, admitimos não-p. Com base nesta suposição, deduzimos uma conclusão que se sabe ser falsa. Como a conclusão falsa decorre da nossa suposição de não-p, em virtude de um argumento dedutivo válido, segue-se que a suposição deve ter sido falsa. Ora, se não-p é falsa, então p deve ser verdadeira – e era justamente o enunciado que desde o começo pretendíamos provar” Eis um exemplo: ´Quem não tem deveres não tem direitos; os bebês não têm deveres; logo, não têm direitos; mas os bebês têm direitos; logo, é falso que direitos; os bebês não têm deveres; logo, não têm direitos; mas os bebês têm direitos;logo, é falso que quem não tem deveres não tem direitos’ Quando se chega a uma contradição num sistema axiomático, pode-se negar qualquer uma das fórmulas anteriores”. Ver: SALMON, Wesley, Lógica. Editora Prentice-Hall do Brasil Ltda, p. 16. Para Atienza, esse tipo de argumento no Direito “tem, em princípio, uma forma dedutiva, mas, tal e qual a utilizam os juristas, a redução ao absurdo costuma ir além de uma simples dedução, por duas razões: em primeiro lugar porque, com freqüência, é preciso entender que determinadas premissas estão simplesmente implícitas (e sem elas não teríamos a forma dedutiva do argumento); e em segundo lugar porque a noção de “absurdo” utilizada pelas juristas não coincide exatamente com a de “contradição lógica” e sim com a de conseqüência inaceitável”. Ver: ATIENZA, Manuel. As razões do Direito: teorias da argumentação jurídica: Perelman, Toulmin, MacCormick, Alexy e outros. São Paulo: Landy Editora, p. 48.

[14] Há outro sentido em se falar em desconstitucionalização que não é o deste texto, quanto se sustenta que matérias apenas formalmente constitucionais, quando não mais reproduzidas no texto constitucional, passam a valer como leis ordinárias. Ver Carré de Malberg, Contribution à la théorie génerale de l´Etat, Paris: Sirey, 1922.

[15] Art. 144 – A família, constituída pelo casamento indissolúvel, está sob a proteção especial do Estado. Parágrafo único – A lei civil determinará os casos de desquite e de anulação de casamento, havendo sempre recurso ex officio, com efeito suspensivo.

[16] PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Comentários à Constituição de 1967: com a Emenda n. 1 de 1969. t .6, arts. 160-200, Forense, p. 320.

[17] Sobre a discussão, ver MÜLLER, Friedrich. Discours de la méthode juridique, Presses Universitaires de France e LARENZ, Karl. Metodologia da Ciência do Direito. 3. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1997, especialmente p. 380e ss.

[18] Conforme Maria Cláudia Cachapuz, “A tarefa da interpretação é encontrar o resultado constitucionalmente ‘exato’ em um procedimento racional e controlável, fundamentar esse resultado racional e controlavelmente e, deste modo, criar certeza e previsibilidade – não, por exemplo, somente decidir por causa da decisão”. Ver: CACHAPUZ, Maria Cláudia. Intimidade e vida privada no novo Código Civil brasileiro: uma leitura orientada no discurso jurídico, p. 13.

[19] Neste sentido, ver: NEIVA, Gerivaldo. A quem pertence o direito de estar ou não casados: ao Estado ou às pessoas?. Disponível em:<http://magrs.net/?p=14019>.

[20] As pessoas que optam pelo casamento civil optam por um ato estatal. Para casar, preenchem requisitos e, no nosso sistema, não podem casar, de forma concomitante, duas vezes. Portanto, a relação de afeto encontra vários obstáculos na lei. Neste sentido, Luís Roberto Barroso assevera: “O casamento tem, como se sabe, natureza consensual – sua celebração depende da vontade das partes -, mas os deveres do casamento não são por elas determinados, decorrendo cogentemente da lei. Não é possível um pacto dispensando formalmente os cônjuges do dever de fidelidade ou da assistência aos filhos”. Ver: BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. São Paulo: Saraiva, p. 58.

[21] A expressão grave insegurança jurídica é utilizada no Artigo 103-A da CF.

Boletim INR nº 4905 – Grupo Serac – São Paulo, 26 de Outubro de 2011.