CSM|SP: Registro de Imóveis – Dúvida julgada procedente – Escritura pública de doação da nua propriedade de imóvel, com constituição de usufruto em favor da donatária – Doação da nua propriedade promovida por marido e mulher, casados pelo regime da comunhão parcial de bens – Inexistência de violação da continuidade registrária – Recurso provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL Nº 994-6/7, da Comarca de OSASCO, em que é apelante LARISSA CASTELLAN TOLEDO e apelado o 2º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS, TÍTULOS E DOCUMENTOS E CIVIL DE PESSOA JURÍDICA da referida Comarca.

ACORDAM os Desembargadores do Conselho Superior da Magistratura, por votação unânime, em dar provimento ao recurso, de conformidade com o voto do Relator que fica fazendo parte integrante do presente julgado.

Participaram do julgamento, com votos vencedores, os Desembargadores ROBERTO VALLIM BELLOCCHI, Presidente do Tribunal de Justiça e MUNHOZ SOARES, Vice-Presidente do Tribunal de Justiça.

São Paulo, 16 de junho de 2009.

(a) RUY CAMILO, Corregedor Geral da Justiça e Relator

VOTO

REGISTRO DE IMÓVEIS – Dúvida julgada procedente – Escritura pública de doação da nua propriedade de imóvel, com constituição de usufruto em favor da donatária – Doação da nua propriedade promovida por marido e mulher, casados pelo regime da comunhão parcial de bens – Inexistência de violação da continuidade registrária – Recurso provido.

Trata-se de apelação interposta, tempestivamente, contra r. sentença que julgou procedente

dúvida suscitada pelo Sr. 2º Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Osasco e manteve a negativa de registro, na matrícula nº 13.678, de escritura pública de doação da nua propriedade promovida por marido e mulher, com reserva de usufruto somente para a doadora.

A apelante alega, em suma, que não há impedimento para o registro de doação com reserva de usufruto, bem como não existe vedação para constituição do usufruto somente em favor da doadora, sendo os doadores do imóvel casados. Cita, em amparo à sua posição, doutrina e antecedentes extraídos de decisões da 1ª Vara de Registros Públicos da Capital.

A douta Procuradoria Geral de Justiça opina pelo provimento do recurso.

O julgamento foi convertido em diligência (fls. 75), com posterior apresentação, pelo 2º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Osasco, de certidão atualizada da matrícula do imóvel doado (fls. 80/81).

É o relatório.

Por escritura pública lavrada em 05 de setembro de 2007, às fls. 93/94 do Livro 735 do 2º Tabelião de Notas de Osasco, Vitor Hugo Zomer Toledo e Denise Antonia Castellan Toledo, casados pelo regime da comunhão parcial de bens, doaram para Larissa Castellan Toledo o imóvel objeto da matrícula nº 13.678 do 2º Registro de Imóveis da Comarca de Osasco, com reserva de usufruto sobre a totalidade do imóvel em favor da doadora Denise Antonia Castellan Toledo.

O registro da escritura foi negado porque a doadora somente é titular da metade, ou meação, do imóvel, mas recebeu o usufruto constituído sobre a totalidade do bem, do que decorria violação da continuidade (fls. 91).

Ocorre, todavia, que a doação com reserva de usufruto foi promovida em conjunto pelos titulares do domínio que de forma expressa e clara manifestaram a inequívoca intenção de manter a reserva do usufruto somente em favor da doadora Denise Antonio Castellan Toledo, o que constou da escritura de compra e venda, com destaque, da seguinte forma: “Que, a presente doação é feita sem nenhuma condição especial, porém fica RESERVADO COM ABSOLUTA EXCLUSIVIDADE somente em favor dela doadora, DENISE ANTONIA CASTELLAN TOLEDO, o usufruto vitalício sobre o referido imóvel (…)” (fls. 12).

E para afastar qualquer dúvida sobre sua real intenção fizeram os doadores constar na escritura que: “(…) a reserva de usufruto ora feita com exclusividade em favor somente dela doadora, encontra suporte na jurisprudência, tendo em vista a brilhante decisão do ilustre e culto magistrado, Doutor Professor Narciso Orlandi Neto, em decisão prolatada em processo de dúvida por ele julgada quando em exercício na 1ª Vara de Registros Públicos da Capital (…)” (fls. 12).

Se aos doadores era permitido reservar o usufruto em seu próprio favor, ou constituí-lo em favor de terceiro, não há porque considerar, diante dos termos do ato jurídico que foi praticado em conjunto pelos proprietários do imóvel, considerar que a reserva de usufruto para a doadora Denise contrariou a continuidade registrária.

Dessa conclusão, observo, não se afastou o douto Procurador de Justiça, Dr. Luiz Felippe de Castilho Filho, ao se posicionar pela admissibilidade do registro (fls. 74).

Outros fundamentos para admitir o registro, de igual relevância, podem ser colhidos da r. sentença prolatada pelo Desembargador Gilberto Valente da Silva, quando Juiz de Direito da 1ª Vara de Registros Públicos da Comarca da Capital, no Processo nº 9.764/72 (citada nas razões de recurso), em que decidido:

“Entretanto, como bem demonstrou o Dr. Curador em seu jurídico parecer, a) se não há nenhum impedimento de ordem legal a macular a doação feita por forma regular; b) se reconhece o direito de o usufrutuário, mesmo depois de instituído o usufruto, a ele renunciar; e c) se a jurisprudência tem reiteradamente admitido o direito de acrescer, no caso de usufruto simultâneo, como acima ficou expressamente mencionado, não se vê como não possa o cônjuge varão, in casu, renunciar não ao usufruto propriamente dito, que em realidade não chegou a ser instituído em seu benefício, mas ao próprio direito de reservá-lo para si na doação feita. Ademais, não ocorreu a reserva por um cônjuge apenas em detrimento do outro, mas, como consta das notas levadas ao registro, ambos os cônjuges doadores estabeleceram que o usufruto dos imóveis continuava a pertencer à doadora. Houve assim reserva apenas para um dos doadores, ocorrendo renúncia do outro em reservá-lo para si ou participar da reserva. (Decisão de 07.03.73)” (apud Ademar Fioranelli, Direito Registral Imobiliário, Porto Alegre: IRIB: Sérgio A. Fabris, 2001, p. 394).

Além desses fundamentos, importa considerar que ao usufruto se atribui, para efeitos fiscais, valor equivalente a um terço do preço do imóvel, restando para a nua propriedade os outros dois terços.

A doadora era titular da meação do imóvel, o que, ao menos para efeitos fiscais, equivale dizer que o valor do usufruto em seu favor reservado é inferior à da meação que detinha, o que também afasta o argumento de que houve excesso na referida reserva.

Ante o exposto, dou provimento ao recurso e julgo a dúvida improcedente.

(a) RUY CAMILO, Corregedor Geral da Justiça e Relator

(D.J.E. de 30.07.2009