TJ|SP: Agravo de instrumento – Penhora – Vaga autônoma de garagem – Possibilidade – Interpretação restritiva – Reconhecido que apesar de ser vedada a alienação de vaga de garagem para terceiros estranhos ao condomínio, é possível a penhora da unidade autônoma – A jurisprudência tem admitido a penhora de tais vagas, quando objeto de matrícula individualizada, com status de unidades autônomas e desvinculadas – Hipótese, entretanto, em que a futura alienação ou transferência do bem somente será admitida em proveito de outros condôminos – Inteligência do art. 2º, §§s 1º e 2º da Lei nº 4864/65, c.c. arts. 1337 e 1338 do NCCB, e a Súmula nº 449 do “STJ” – Agravo provido, com observação.

EMENTA

“AGRAVO DE INSTRUMENTO – PENHORA – VAGA AUTÔNOMA DE GARAGEM – POSSIBILIDADE – INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA – Reconhecido que apesar de ser vedada a alienação de vaga de garagem para terceiros estranhos ao condomínio, é possível a penhora da unidade autônoma – A jurisprudência tem admitido a penhora de tais vagas, quando objeto de matrícula individualizada, com status de unidades autônomas e desvinculadas – Hipótese, entretanto, em que a futura alienação ou transferência do bem somente será admitida em proveito de outros condôminos – Inteligência do art. 2º, §§s 1º e 2º da Lei nº 4864/65, c.c. arts. 1337 e 1338 do NCCB, e a Súmula nº 449 do “STJ” – Agravo provido, com observação.” (TJSP – Agravo de Instrumento nº 0246333-46.2011.8.26.0000 – São Paulo – 24ª Câmara de Direito Privado – Rel. Des. Salles Vieira – DJ 09.12.2011)

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº 0246333-46.2011.8.26.0000, da Comarca de São Paulo, em que é agravante VECCHIO EMPORIO INDUSTRIA E COMERCIO DE ALIMENTOS LTDA. sendo agravado LYNCCE COMERCIO E SERVIÇOS DE CONSTRUÇÃO CIVIL LTDA..

ACORDAM, em 24ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento ao recurso, com observação. V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores SALLES VIEIRA (Presidente), PLINIO NOVAES DE ANDRADE JÚNIOR E CESAR MECCHI MORALES.

São Paulo, 24 de novembro de 2011.

SALLES VIEIRA – Presidente e Relator.

RELATÓRIO

Agravo de instrumento tirado de ação de execução, em face da r. decisão que indeferiu a penhora de vagas de garagem vinculadas ao imóvel de propriedade do sócio da executada.

A Súmula 449 do STJ prevê que a vaga de garagem que possui matrícula autônoma não constitui bem de família. A decisão agravada diverge da Súmula. A vaga possui matrícula própria. As referidas vagas estão livres e desembaraçadas. A penhora é cabível na espécie. Requer a concessão de efeito suspensivo ao recurso e, ao final, o seu provimento.

Recurso processado com suspensividade (fls. 208/209).

É o relatório.

VOTO

Trata-se de execução na qual foi requerida a penhora de 07 vagas de garagem autônomas registradas em nome do sócio da executada.

O MM. Juiz a quo indeferiu o pedido fundado no fato de que as vagas estariam vinculadas a imóveis, e que, ainda que tenham matrículas autônomas, há restrições quanto à alienação de vagas de estacionamento em condomínio edilício (fl. 204).

Contra esta r. decisão insurge-se o exeqüente, ora agravante.

Não há óbice para a penhora de vagas de garagem quando estas possuírem matrícula própria junto ao registro de imóveis, conforme entendimento sumulado do “STJ”.

Dispõe a Súmula nº 449 do “STJ”:

“A vaga de garagem que possui matrícula própria no registro de imóveis não constitui bem de família para efeito de penhora”.

A jurisprudência, igualmente, tem admitido a penhora de tais vagas, quando objeto de matrícula individualizada, com status de unidades autônomas e desvinculadas.

Veja-se:

Execução – penhora – vagas de garagem do apartamento residencial, individualizadas como unidades autônomas, com registros e matrículas próprias – impenhorabilidade afastada incidência da Súmula 449 do C. STJ – recurso improvido.” – TJSP – AI 0504900-23.2010.8.26.0000, Relator(a): Jovino de Sylos, Data do julgamento: 08/02/2011.

Penhora – Incidência sobre cinco vagas de garagem – Admissibilidade – Aplicação da Súmula 449 do STJ – Vagas de garagem que estão classificadas como unidades autônomas, com fração ideal de terreno específica, dotadas de matrícula própria no respectivo cartório de registro de imóveis – Bens passíveis de serem desvinculados da unidade autônoma principal – Bens que podem ser objeto de constrição judicial – Não incidência da impenhorabilidade prevista no art. 1º da Lei 8.009/90. Penhora – Incidência sobre cinco vagas de garagem – Prematuro declarar-se a impenhorabilidade da parte ideal pertencente à esposa do co-executado – Não demonstrado, nesta sede, que a dívida contraída pelo co-executado não tenha beneficiado a sua família – Impossibilidade de se excluir, nesse momento, a meação da agravante da penhora realizada – Agravo desprovido.” – TJSP – 57 – AI 0501760-78.2010.8.26.0000 – Relator(a): José Marcos Marrone – Data do julgamento: 02/02/2011.

Execução de Título Extrajudicial – Penhora de três vagas de garagem – Bens penhoráveis – Súmula 449 do STJ – Alegação de excesso de penhora – Pedido de desconstituição de penhora sobre duas vagas de garagem – Excesso de penhora reconhecido, porém, mantida a penhora em relação às três vagas de garagem – Preferência à praça da mais valiosa que, se arrematada por valor que supere a dívida, fica preservada a vaga remanescente – Recurso desprovido, com observação.” – TJSP – AI 0572543-95.2010.8.26.0000 – Relator(a): Ademir Benedito, Data do julgamento: 25/05/2011.

No caso dos autos, inexiste alegação de bem de família, e as vagas de garagem sobre as quais é pretendida a penhora, são realmente autônomas, conforme se depreende das certidões de matrícula juntadas às fls. 195/201.

Entretanto, ao permitir a penhora sobre as vagas de garagem, esbarra-se na vedação legal contida na Lei nº 4.591/64, com as alterações introduzidas pela Lei nº 4.864/65, que impede a alienação da unidade a pessoas estranhas ao condomínio:

“Art. 2º – Cada unidade com saída para a via pública, diretamente ou por processo de passagem comum, será sempre tratada como objeto de propriedade exclusiva, qualquer que seja o número de suas peças e sua destinação, inclusive edifício-garagem, com ressalva das restrições que se lhe imponham.

§ 1º – O direito à guarda de veículos nas garagens ou locais a isso destinados nas edificações ou conjuntos de edificações será tratado como objeto de propriedade exclusiva, com ressalva das restrições que ao mesmo sejam impostas por instrumentos contratuais adequados, e será vinculada à unidade habitacional a que corresponder, no caso de não lhe ser atribuída fração ideal específica de terreno. (Parágrafo incluído pela Lei nº 4.864, de 29.11.1965)

§ 2º – O direito de que trata o § 1º deste artigo poderá ser transferido a outro condômino, independentemente da alienação da unidade a que corresponder, vedada sua transferência a pessoas estranhas ao condomínio. (Parágrafo incluído pela Lei nº 4.864, de 29.11.1965)“.

Ora, se intransferível a terceiros estranhos à relação condominial, conforme dispõe a Lei nº 4.591/64, como sustentar a penhorabilidade deste acessório?

Conclui-se que embora cabível a penhora, a teor do disposto na Súmula nº 449 do “STJ”, estas vagas somente poderão ser vendidas, permutadas ou cedidas, arrematadas ou adjudicadas, pelos próprios condôminos.

Nesta linha de raciocínio, há de se destacar a ementa de um dos v. arestos do “STJ” que deram origem a edição da Súmula nº 449, veja-se:

“RESP nº 23.420-0 – RS – Rel. Min. Milton Luiz de Oliveira – 1ª Turma – Data do julgamento: 31.08.94 – Data da publicação: 26.09.94 – EMENTA: EXECUÇÃO FISCAL – PRÉDIO CONDOMINIAL – PENHORA DE BOXE-GARAGEM – POSSIBILIDADE – LEI Nº 4.591/64 (ART.2º, §§ 1º E 2º) – LEI 8009/90 (ART.1º) – 1. O boxe de estacionamento, como objeto de circulação econômica, desligado do principal, pode ser vendido, permutado ou cedido a condômino diverso, saindo da propriedade de um parta outro, continuando útil à sua finalidade de uso, visto que não está sob o domínio de comunhão geral, mas identificado como unidade autônoma. Em assim sendo, penhorável para garantia da execução, sem as restrições apropriadas ao imóvel de moradia familiar. 2. Precedentes. 3. Recurso provido”.

E ainda, o NCCB, em seus arts. 1337 e 1338 prevêem não só possibilidade de exclusão do condômino por reiterado comportamento anti-social, mas como também o direito de preferência dos condôminos em hipótese de locação ou alienação a área de abrigo para carros.

Estes dispositivos servem para corroborar o entendimento acima exposto, com vistas à preservação da vida condominial, mas sem prejuízo da possibilidade de penhora da unidade autônoma.

A solução que melhor se impõe, por conseguinte, é a de permitir a penhora sobre as 07 vagas de garagem; mesmo porque não há impedimento legal para isso, mas ressalvando, no entanto, que sua alienação ou transferência posterior somente poderão ser feitas entre condôminos.

Dá-se provimento ao recurso, com observação.

SALLES VIEIRA – Relator.

Fonte: Boletim INR nº 5128 – Grupo Serac – São Paulo, 27 de Fevereiro de 2012.