CSM|SP: Registro de Imóveis. Dúvida. Escritura pública de venda e compra. Casal de estrangeiros como vendedores, hoje em lugar incerto e não sabido, que receberam o imóvel em inventário, com formal de partilha registrado em 1998, qualificados no R.1 da matrícula. Qualificação idêntica à constante da escritura, notadamente quanto a nomes, profissões, estado civil e números de documentos de identidade. Falta dos números de inscrição dos vendedores no CPF. Situação tabular anterior ao advento de normas imperativas a respeito. Cabimento do registro postulado, dadas as peculiaridades do caso, como corolário dos princípios da especialidade pessoal e da continuidade. Recurso provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 860-6/6, da Comarca de São Bernardo do Campo, em que são apelantes Luiz Paulo Daltrino e Lourdes Galhardi Daltrino e apelado o 1º Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da mesma Comarca.

Acordam os Desembargadores do Conselho Superior da Magistratura, por votação unânime, em dar provimento ao recurso, de conformidade com os votos do Desembargador Relator e do Desembargador Revisor que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Participaram do julgamento, com votos vencedores, os Desembargadores Roberto Vallim Bellocchi, Presidente do Tribunal de Justiça e Jarbas Mazzoni, Vice-Presidente do Tribunal de Justiça.
São Paulo, 08 de julho de 2008

Ruy Camilo, Corregedor Geral da Justiça e Relator

VOTO
Registro de Imóveis. Dúvida. Escritura pública de venda e compra. Casal de estrangeiros como vendedores, hoje em lugar incerto e não sabido, que receberam o imóvel em inventário, com formal de partilha registrado em 1998, qualificados no R.1 da matrícula. Qualificação idêntica à constante da escritura, notadamente quanto a nomes, profissões, estado civil e números de documentos de identidade. Falta dos números de inscrição dos vendedores no CPF. Situação tabular anterior ao advento de normas imperativas a respeito. Cabimento do registro postulado, dadas as peculiaridades do caso, como corolário dos princípios da especialidade pessoal e da continuidade. Recurso provido.

Cuida-se de apelação interposta por Luiz Paulo Daltrino e sua mulher Lourdes Galhardi Daltrino contra sentença que julgou procedente a dúvida suscitada pelo 1º Oficial de Registro de Imóveis de São Bernardo do Campo e manteve sua recusa quanto ao registro de escritura de venda e compra referente ao imóvel da matrícula nº 80.779, sob o fundamento de que dela não constaram os números de inscrição dos outorgantes-vendedores no Cadastro de Pessoas Físicas – CPF.

Sustentam os apelantes, outorgados-compradores, que os vendedores são estrangeiros, não residentes no Brasil, os quais se encontram em local incerto e não sabido. Afirmam que o negócio, na verdade, foi celebrado em 1993, por instrumento particular juntado aos autos, sendo que o registro do formal de partilha a favor dos vendedores só sobreveio em 1998, tudo, de qualquer forma, antes do advento de normatização sobre a inscrição no CPF.

Salientam a plena regularidade da aquisição, a impossibilidade de localizar os alienantes e o grave prejuízo em perspectiva (fls. 52/55).

O Ministério Público, em derradeira manifestação, opina pela manutenção da recusa e da sentença, por seus fundamentos (fls. 61/63).

É o relatório.

As peculiaridades da hipótese concreta estão a revelar que o acesso almejado não representa ameaça ao sistema.

De se notar que o imóvel está devidamente matriculado, encontrando-se os ora alienantes nomeados e qualificados no derradeiro registro, sendo certo que não se discute, aqui, a possibilidade, ou não, de seu ingresso no fólio real como sujeitos de direito, mesmo porque ali já figuram. Cogita-se, isto sim, de transmissão que fazem (de modo a serem excluídos do álbum) aos recorrentes, por venda.

Deveras, já existe na matrícula (fls. 72) registro válido em nome dos vendedores (R.1), efetuado em 20 de julho de 1998, com seus dados de qualificação, referente ao ingresso do formal de partilha oriundo do inventário de José Ramiro Cao Hermida.

Tal registro precedeu o advento de normas impositivas referentes à inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas CPF (Dec. 3.000/99, Instrução Normativa 461/04 e Dec. nº 4.166/02) e foi realizado na vigência do art. 176, § 1º, III, 2, a, da Lei nº 6.015/73, que perdura. De se observar, neste diapasão, que há plena coincidência entre os dados de qualificação pessoal constantes do registro citado e os consignados na escritura de venda e compra apresentada, tais como nomes, profissões, números de documentos de identidade e estado civil.

Assim, sob a égide dos princípios da especialidade pessoal, com identificação segura dos alienantes, e da continuidade, uma vez que figuram em registro lançado na matrícula, achando-se tabularmente legitimados para transferir o imóvel no âmbito de cadeia dominial, exsurge a viabilidade do ato registrário postulado.

Confira-se, nesse rumo, o escólio de Afrânio de Carvalho: A seqüência natural é a indagação da identidade das partes e do imóvel constantes do título submetido ao registro. Há que verificar se esses dois elementos da relação jurídica, pessoal e real, se acham precisamente indicados no título e coincidem com os consignados no registro. Acompanhando a ordem lógica deles, atende-se em primeiro lugar à identidade das partes, a fim de se chegar logo à certeza sobre o sujeito do direito, sem a qual não é curial prosseguir, sendo, portanto, eliminatórias estas duas verificações: a) identidade das partes nomeadas no título com as pessoas a quem os nomes pertencem; b) identidade da parte disponente do direito com a pessoa inscrita no livro como titular dele (Registro de Imóveis, 4ª edição, Forense, Rio de Janeiro, 1998, pág. 243).

Bem demonstrada, como dito, essa identidade, para efeito registrário, a isto se restringindo a análise aqui levada a efeito. Assim, em face da peculiaridade e especificidade do caso concreto analisado nos autos, afigura-se possível o registro postulado.

Diante do exposto, dou provimento ao recurso, para julgar improcedente a dúvida.

Ruy Camilo, Corregedor Geral da Justiça e Relator

VOTO
1. Trata-se de recurso interposto contra sentença que julgou procedente dúvida suscitada pelo 1º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de São Bernardo do Campo, que recusou o registro de escritura pública de venda e compra, sob o alicerce de que dela não constaram os números de inscrição dos outorgantes-vendedores no Cadastro de Pessoas Físicas CPF, do Ministério da Fazenda.

Alegam os recorrentes, outorgados-compradores, que os vendedores são estrangeiros, que não residem no país e que se encontram em local incerto e não sabido. Asseveram que o negócio, verdadeiramente, foi celebrado em 1993, por instrumento particular juntado aos autos, sendo que o registro do formal de partilha a favor dos vendedores só aconteceu em 1998, tudo, de qualquer modo, antes do surgimento da normatização sobre a inscrição no CPF/MF. Destacam a cabal regularidade da aquisição, a dificuldade de localizar os alienantes e a séria probabilidade de prejuízo.

A Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso.

É a síntese do necessário.

As particularidades do caso sub examem estão a indicar que o pretendido ingresso ao registro, não representa ameaça ao sistema.

Por proêmio, nota-se que, na matrícula anterior, há elementos suficientes que identificam e qualificam os alienantes, não se podendo discutir, neste momento, a possibilidade, ou não, de sua admissão no fólio real como sujeitos de direito, pois nele já figuram.

Realmente, já existe na referida matrícula, registro válido em nome dos vendedores. Este registro ocorreu antes do advento das normas imperativas referentes à inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas CPF (Decreto nº 3.000/1999, Instrução Normativa nº 461/2004 e Decreto nº 4.166/2002) e foi efetuado na vigência do artigo 176, § 1º, III, 2, a, da Lei nº 6.015/1973, que permanece.

Observa-se, ainda, que há perfeita concordância entre os dados de qualificação pessoal constantes do registro citado e os declarados na escritura de venda e compra apresentada.

Assim, bem demonstrada essa identidade, perante a peculiaridade e especificidade do caso em concreto analisado nos autos, apresenta-se viável o registro postulado.

Por essas razões, dá-se provimento ao recurso, julgando-se improcedente a dúvida.

2. Recurso provido. Dúvida julgada improcedente. Registro de escritura pública de venda e compra, em conformidade com os elementos indicativos na matrícula anterior. Princípios da especialidade e da continuidade respeitados.

Jarbas Mazzoni, Vice-Presidente do Tribunal de Justiça