CSM|SP: Apelação – Registro de Imóvel – Recusa – Compromisso de Compra e Venda – Não Incidência Do ITBI – Pagamento antecipado do tributo – Inexistência do fato gerador – Lapso temporal de mais de 40 anos entre o Pagamento do ITBI antecipado e a lavratura de escritura de venda e compra. Recurso conhecido, mas não provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL N° 0015683-73.2011.8.26.0590, da Comarca de SÃO VICENTE, em que é apelante ANTONIO CARLOS JULIANELLI FERRÃO e apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS, TÍTULOS E DOCUMENTOS E CIVIL DE PESSOA JURÍDICA da referida Comarca.

ACORDAM os Desembargadores do Conselho Superior da Magistratura, por votação unânime, em negar provimento ao recurso de apelação, de conformidade com o voto do Desembargador Relator, que fica fazendo parte integrante do presente julgado.

Participaram do julgamento os Desembargadores IVAN RICARDO GARISIO SARTORI, Presidente do Tribunal de Justiça, JOSÉ GASPAR GONZAGA FRANCESCHINI, Vice-Presidente do Tribunal de Justiça, WALTER DE ALMEIDA GUILHERME, decano em exercício, SAMUEL ALVES DE MELO JUNIOR, ANTONIO JOSÉ SILVEIRA PAULILO e ANTONIO CARLOS TRISTÃO RIBEIRO, respectivamente, Presidentes das Seções de Direito Público, Privado e Criminal do Tribunal de Justiça.

São Paulo, 12 de setembro de 2012.

(a) JOSÉ RENATO NALINI, Corregedor Geral da Justiça e Relator

VOTO

APELAÇÃO – REGISTRO DE IMÓVEL – RECUSA – COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA – NÃO INCIDÊNCIA DO ITBI – PAGAMENTO ANTECIPADO DO TRIBUTO – INEXISTÊNCIA DO FATO GERADOR – LAPSO TEMPORAL DE MAIS DE 40 ANOS ENTRE O PAGAMENTO DO ITBI ANTECIPADO E A LAVRATURA DE ESCRITURA DE VENDA E COMPRA. Recurso conhecido, mas não provido.

Trata-se de recurso de apelação interposto por Antônio Carlos Julianelli Ferrão contra a sentença de procedência da dúvida (fls. 57/60) proferida pelo r. Juiz Corregedor Permanente do Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoas Jurídicas da Comarca de São Vicente.

Discute-se nos autos a legitimidade da recusa do registro da escritura de compra e venda de imóvel lavrada em 15 de junho de 2011, no 6º Tabelião de Notas de São Paulo, pelo Registro de Imóveis de São Vicente sob o fundamento de falta de recolhimento atual do ITBI e impossibilidade de reconhecimento do pagamento antecipado do imposto com base na Lei Municipal 986/64.

O recorrente sustenta que seu avô, compromissário comprador do imóvel, teria recolhido o ITBI de forma antecipada no ano de 1964 com base na Lei Municipal 986/64, fato bastante a autorizar o registro imobiliário sem novo desembolso.

A Douta Procuradoria de Justiça opinou pelo não provimento do recurso de apelação. Sustentou que a aquisição da propriedade imóvel decorre da transcrição do título de transferência no registro imobiliário, nos termos do art. 1.245 do Código Civil. Assim, a mera formalização de contrato de compra e venda não constitui fato gerador do imposto, o que impede a consideração do desembolso de outrora pelo avô do apelante para fim de viabilizar o registro.

É o relatório.

O recurso de apelação não merece provimento.

A recusa do Oficial no registro da escritura e a sentença de manutenção do ato pelo Juiz Corregedor Permanente foram acertadas.

A Lei 986/64 do Município de São Vicente (transcrita manuscrita às fls. 38/39) estabelecia em seu art. 1º que “é facultado ao compromissário comprador (…) ainda que esteja quitado ou vencido o compromisso, recolher, por antecipação, (…) pelo valor do imóvel à data do compromisso originário (…) o imposto sobre transmissão da propriedade imóvel “inter-vivos”, devido pela transmissão ou cessão, desde que o faça até 120dias da data da promulgação desta lei”.

De fato, compete, na forma do art. 156, II, da Constituição, ao Município instituir e cobrar o ITBI.

Todavia, o imposto é devido somente por ocasião do registro da transmissão da propriedade de bens ou direitos, a teor do disposto no art. 1245 do Código Civil – “transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis. § 1º. Enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel” (Agr. Reg. Em Agr. Inst. N° 448.245/DF, Rel. Min. Luiz Fux).

A respeito da exigência de pagamento de ITBI antes do registro do título translativo da propriedade vale colacionar parte do voto proferido pelo Des. Roberto Martins de Souza na Apelação n° 0039993-95.2009.8.26.0564, da Comarca de São Bernardo, com plena aplicação ao caso em tela:

(…) cabe aqui o ensinamento de Kiyoshi Harada: “(…) Convém ressaltar, que a transmissão da propriedade imobiliária só se opera com o registro do título de transferência no registro de imóveis competente, segundo o art. 1.245 do Código Civil, que assim prescreve: ‘Transfere-se entre vivos a propriedade mediante registro do título translativo no Registro de Imóveis.’ O § 1º desse artigo dispõe enfaticamente que “enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel”. Portanto, a exigência do imposto antes da lavratura da escritura de compra e venda ou do contrato particular, quando for o caso, como consta da maioria das legislações municipais, é manifestamente inconstitucional. Esse pagamento antecipado do imposto não teria amparo no § 7º do art. 150 da CF, que se refere à atribuição ao ‘sujeito passivo de obrigação tributária a condição de responsável pelo pagamento de imposto ou contribuição, cujo fato gerador deva ocorrer posteriormente, assegurada a imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido’.

“Por isso, o STJ já pacificou sua jurisprudência no sentido de que o ITBI deve incidir apenas sobre transações registradas em cartório, que impliquem efetiva transmissão da propriedade imobiliária (Resp 1.066, 253364, 12.546, 264064, 57.641; AGA 448.245; ROMS 10.650). Curvamo-nos à jurisprudência remansosa do STJ, reformulando nosso ponto de vista anterior, quer porque inaplicável o § 7º do art. 150 da CF em relação ao ITBI, quer porque o fato gerador desse imposto, eleito pelo art. 35, II, do CTN em obediência ao disposto no art. 156, II, da CF, é uma situação jurídica, qual seja, a transmissão da propriedade imobiliária.” (“Direito Tributário Municipal”, segunda edição, São Paulo: Atlas, página 100).

Assim, inexistindo fato gerador autorizador da cobrança e pagamento do ITBI em 1964, ainda que pautado em Lei Municipal da época, pelo avô do apelante, o montante desembolsado só poderia ser objeto de repetição de indébito, mas não utilizado, 40 anos depois, para fim de permitir o registro, como bem observado pelo Oficial do Registro de Imóveis de São Vicente.

Nesse sentido já decidiu a Suprema Corte:

“EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL. OFENSA INDIRETA À CONSTITUIÇAO DO BRASIL. CONTRATO DE COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA. NÃO INCIDÊNCIA DO ITBI. 1. Controvérsia decidida à luz de normas infraconstitucionais. Ofensa indireta à Constituição do Brasil. 2. A celebração de contrato de compromisso de compra e venda não gera obrigação ao pagamento do ITBI. Agravo regimental a que se nega provimento (AI- AgR 603309/MG, Rel. Min. EROS GRAU, t2 julgamento : 18/12/2006).

Pelo todo exposto, nego provimento ao recurso de apelação.

(a) JOSÉ RENATO NALINI, Corregedor Geral da Justiça e Relator (D.J.E. de 10.01.2013 – SP)