CSM|SP: Registro de Imóveis – Contrato de comodato – Acesso ao fólio real recusado – Desqualificação do título mantida – Embargos de declaração rejeitados.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de EMBARGOS DE DECLARAÇÃO N° 0003481-41.2011.8.26.0242/50000, da Comarca de IGARAPAVA em que é embargante RAÍZEN S/A BIOENERGIA e embargado o OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS, TÍTULOS E DOCUMENTOS E CIVIL DE PESSOA JURÍDICA da referida Comarca.

ACORDAM os Desembargadores do Conselho Superior da Magistratura, por votação unânime, em rejeitar os Embargos de Declaração, de conformidade com o voto do Desembargador Relator, que fica fazendo parte integrante do presente julgado.

Participaram do julgamento os Desembargadores IVAN RICARDO GARISIO SARTORI, Presidente do Tribunal de Justiça, JOSÉ GASPAR GONZAGA FRANCESCHINI, Vice-Presidente do Tribunal de Justiça, SAMUEL ALVES DE MELO JUNIOR, ANTONIO JOSÉ SILVEIRA PAULILO e ANTONIO CARLOS TRISTÃO RIBEIRO, respectivamente, Presidentes das Seções de Direito Público, Privado e Criminal do Tribunal de Justiça.

São Paulo, 27 de setembro de 2012.

(a) JOSÉ RENATO NALINI, Corregedor Geral da Justiça e Relator

VOTO

REGISTRO DE IMÓVEIS – Contrato de comodato – Acesso ao fólio real recusado – Desqualificação do título mantida – Embargos de declaração rejeitados.

A recorrente, inconformada com o desprovimento do recurso de apelação, determinante da manutenção da desqualificação do título apresentado para registro, opôs embargos de declaração, em cujo corpo alegou: não há razão para, autorizada a averbação do contrato de locação, impedir o acesso do contrato de comodato ao fólio real; a lista de títulos suscetíveis de registro não é taxativa; e a recusa do registro traz prejuízos para ela, impedida de participar de licitações promovidas por órgão estatal (fls. 69/71).

É o relatório.

Conforme o v. acórdão proferido, ficou definido (fls. 60/65):

O rol dos atos suscetíveis de registro é taxativo, quer dizer, a enumeração é numerus clausus, razão pela qual apenas os atos expressamente previstos em lei, ainda que fora da lista do artigo 167, I, da Lei n.º 6.015/1973, são passíveis de registro.

Destarte, ausente no elenco dos atos registráveis, o contrato de comodato não comporta registro stricto sensu.

Mesmo que se flexibilize a taxatividade dos títulos registráveis, (…) a desconsideração episódica do numerus clausus dos títulos registráveis, pautada pela instrumentalidade do registro, prudência e pelo princípio fundamental da segurança jurídica, é, in concreto, injustificável, porquanto, malgrado a ordem jurídica pátria preveja direitos obrigacionais registráveis, o contrato de comodato, estranho ao rol aludido, não tem potencial para declarar, constituir, modificar, transferir ou extinguir um direito real.

Também por isso, porque desprovidos de eficácia real e, particularmente, sem aptidão para alterar o registro, para modificar uma situação de direito real inscrito, limitando-se à esfera obrigacional, o contrato de comodato – não relacionado entre os atos averbáveis (artigo 167, II, da Lei n.º 6.015/1973) -, é insuscetível de averbação, apesar do caráter enunciativo da lista positivada (artigo 246 da Lei n.º 6.015/1973).

Aliás, com a aprovação do parecer da lavra do Juiz Vicente de Abreu Amadei, por meio de decisão do Desembargador Gilberto Passos de Freitas, lançada, no dia 13 de julho de 2007, nos autos do processo CG n.º 850/2006, assentou-se: a abertura extraída do artigo 246 da Lei n.º 6.015/1973 “é restrita às hipóteses de averbações enunciativas de ocorrências modificativas de registro.”

E consoante a oportuna advertência de Afranio de Carvalho, “o registro não é o desaguadouro comum de todos e quaisquer títulos, senão apenas daqueles que confiram uma posição jurídico-real”, a par de outros, que sem tal vocação e potência, isto é, sem irradiar efeitos reais, são, por expressa disposição legal, suscetíveis de registro.

Assim sendo, a conduta da registrador se revelou correta: a propósito, de acordo com o item 68.3. do capítulo XX das NSCGJ, “o protesto contra alienação de bens, o arrendamento e o comodato são atos insuscetíveis de registro, admitindo-se a averbação do protesto contra alienação de bens diante de determinação judicial expressa do juiz do processo.”

Inclusive, a exceção contemplada – para admitir, contra a jurisprudência administrativa que prevalecia no Conselho Superior da Magistratura e na Corregedoria Geral da Justiça deste Tribunal, a averbação do protesto contra alienação de bens, mas não do contrato de comodato -, objetivou harmonizar o regramento administrativo com o entendimento da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, expresso no julgamento dos Embargos de Divergência no Recurso Especial n.º 440.837/RS, ocorrido em 16 de agosto de 2006.

Vale dizer: não serve de parâmetro para, fora da compreensão da regra do artigo 246 da Lei n.º 6.015/1973, acima enfrentada, alargar os títulos passíveis de averbação e, especialmente, assegurar o acesso do contrato de comodato – marcado pela temporariedade, que lhe é ínsita, e situado no universo do direito obrigacional -, ao álbum imobiliário.

Por fim, o Conselho Superior da Magistratura, na apelação cível n.º 1.396-0, julgada no dia 22 de junho de 1982, relator Desembargador Bruno Affonso de André, concluiu, ao confirmar a sentença proferida pelo magistrado Narciso Orlandi Neto, que o contrato de comodato é insuscetível de registro e de averbação. (…) (fls. 63/65).

Assim sendo, os fundamentos expostos bastam para justificar a desqualificação do título, embora o contrato de locação comporte averbação e a lista de títulos suscetíveis de assento registral seja enunciativa.

O v. acórdão, de fato, não se ressente de quaisquer contradições, obscuridades ou omissões relevantes: as questões centrais foram apreciadas e o desate da apelação se harmoniza com os fundamentos expostos.

Por fim, exigência imposta por órgão estatal, então como condição para participação em licitação, é insuficiente para determinar o assento pretendido, corretamente brecado, à luz das considerações aduzidas.

Pelo exposto, rejeito os embargos de declaração.

(a) JOSÉ RENATO NALINI, Corregedor Geral da Justiça e Relator (D.J.E. de 11.01.2013 – SP)