CSM|SP: Lotes reservados ao município quando da aprovação de loteamento – Possibilidade do descerramento das matrículas e realização dos registros nos termos do art. 195-A da Lei dos Registros Públicos – Recurso não provido com observação.

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO N° 0009388-54.2011.8.26.0126, da Comarca de Caraguatatuba, em que é apelante MUNICÍPIO DE CARAGUATATUBA, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS, TÍTULOS E DOCUMENTOS E CIVIL DE PESSOA JURÍDICA DA COMARCA DE CARAGUATATUBA.
ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO COM OBSERVAÇÃO, V.U.”, de conformidade com o voto do(a) Relator(a), que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Desembargadores IVAN SARTORI (Presidente), GONZAGA FRANCESCHINI, WALTER DE ALMEIDA GUILHERME, SILVEIRA PAULILO, SAMUEL JÚNIOR E TRISTÃO RIBEIRO.
São Paulo, 6 de novembro de 2013.
JOSÉ RENATO NALINI
Corregedor Geral da Justiça e Relator
VOTO N° 21.346
Lotes reservados ao município quando da aprovação de loteamento – Possibilidade do descerramento das matrículas e realização dos registros nos termos do art. 195-A da Lei dos Registros Públicos – Recurso não provido com observação.
Apela o Município de Caraguatatuba contra a r Sentença [1] que, nos autos do procedimento administrativo de dúvida inversa, indeferiu o descerramento de matrículas e registro em favor da municipalidade dos lotes de n. 13 ao 22, da quadra E, do Loteamento denominado Jardim Terrelão. Aduz o apelante a possibilidade do registro em virtude dos lotes serem da sua titularidade consoante projeto aprovado e legislação incidente [2].
A Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento da apelação [3].
É o relatório.
Houve erro material na r. sentença objeto deste recurso, pois, a dúvida, suscitada de forma inversa, foi julgada procedente e não improcedente como constou, porquanto a decisão teve pela correção da recusa do Sr. Oficial em efetuar o descerramento de matrículas e os subsequentes registros.
O loteamento foi aprovado pela prefeitura municipal em 08.02.1974 por meio do Decreto n. 04/74 (a fls. 12) e registrado em 22.12.1977 (a fls. 08/11).
A legislação incidente à época eram o Decreto-lei n. 58/37 e o Decreto-lei n. 267/67. O art. 10° do Decreto-lei n. 267/67 mantinha expressamente a incidência do Decreto-lei n. 58/37, aliás, este último diploma legal foi expressamente citado no registro do loteamento (a fls. 08).
A Lei Municipal n. 531/64 determinava a doação de lotes destinados à construção de escolas, assim, o art. 1º, parágrafo único, do Decreto Municipal n. 04/74 ao aprovar o loteamento estabeleceu “Ficam reservados à prefeitura (…) os lotes de ns. 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20 e 21 da quadra “E””.
Nesse contexto, compreende-se que a intenção foi a transferência desses lotes à municipalidade; aliás, o não descerramento de matrículas e ou notícias de negociação dos lotes pelo loteador reforça esse entendimento.
O art. 4º, caput, do Decreto-lei n. 267/67 tem a seguinte redação:
Art 4º Desde a data da inscrição do loteamento passam a integrar o domínio público de Município as vias e praças e as áreas destinadas a edifícios públicos e outros equipamentos urbanos, constantes do projeto e do memorial descritivo.
Portanto, todos os bens atribuídos à municipalidade em sentido amplo (bens públicos) eram transmitidos por expressa previsão legal.
Essa situação foi reforçada pelo disposto no art. 195-A da Lei n. 6.015/73, cuja redação é a seguinte:
Art. 195-A. O Município poderá solicitar ao registro de imóveis competente a abertura de matrícula de parte ou da totalidade de imóveis públicos oriundos de parcelamento do solo urbano, ainda que não inscrito ou registrado, por meio de requerimento acompanhado dos seguintes documentos:
I – planta e memorial descritivo do imóvel público a ser matriculado, dos quais constem a sua descrição, com medidas perimetrais, área total, localização, confrontantes e coordenadas preferencialmente georreferenciadas dos vértices definidores de seus limites;
// – comprovação de intimação dos confrontantes para que informem, no prazo de 15 (quinze) dias, se os limites definidos na planta e no memorial descritivo do imóvel público a ser matriculado se sobrepõem às suas respectivas áreas, se for o caso;
III – as respostas à intimação prevista no inciso II, quando houver; e
IV – planta de parcelamento assinada pelo loteador ou aprovada pela prefeitura, acompanhada de declaração de que o parcelamento se encontra implantado, na hipótese deste não ter sido inscrito ou registrado.
§ 1º Apresentados pelo Município os documentos relacionados no caput, o registro de imóveis deverá proceder ao registro dos imóveis públicos decorrentes do parcelamento do solo urbano na matrícula ou transcrição da gleba objeto de parcelamento.
§ 2º Na abertura de matrícula de imóvel público oriundo de parcelamento do solo urbano, havendo divergência nas medidas perimetrais de que resulte, ou não, alteração de área, a situação de fato implantada do bem deverá prevalecer sobre a situação constante do registro ou da planta de parcelamento, respeitados os limites dos particulares lindeiros.
§ 3º Não será exibido, para transferência de domínio, formalização da doação de áreas públicas pelo loteador nos casos de parcelamentos urbanos realizados na vigência do Decreto-Lei nº 58, de 10 de dezembro de 1937.
§ 4º Recebido o requerimento e verificado o atendimento aos requisitos previstos neste artigo, o oficial do registro de imóveis abrirá a matrícula em nome do Município.
§ 5º A abertura de matrícula de que trata o caput independe do regime jurídico do bem público. (grifos nossos)
Considerando o disposto no art. 4º e 10º do Decreto-lei n. 267/67 e no art. 195-A, caput e parágrafo 3º, da lei 6.015/73, tenho pela possibilidade da abertura de matrícula dos lotes e realização dos registros, sendo desnecessária a efetivação de negócio jurídico (título) em decorrência da expressa disposição legal no sentido da regularização da situação existente.
Diante disso, os fundamentos da decisão do MM Juiz Corregedor Permanente, ratificando o entendimento do Sr. Oficial do Registro Imobiliário, não se sustentam.
Sabidamente cabe aplicação da lei vigente ao tempo do registro (tempus regit actum), o requerente não apresentou seu requerimento em conformidade ao procedimento previsto no art. 195-A, caput, da Lei n. 6.015/73, portanto, por razões diversas das constantes da r. sentença, não cabe a realização dos registros pretendidos sem o cumprimento dos atos previstos em lei.
Nessa quadra, inviável o provimento do recurso, competirá ao apelante o cumprimento da determinação legal para o atendimento de sua pretensão.
Ante o exposto, nego provimento ao recurso com observação.
JOSÉ RENATO NALINI
Corregedor Geral da Justiça e Relator
Notas:
[1] Fls. 76/83.
[2] Fls. 100/107.
[3] Fls. 91/101. (D.J.E. de 14.01.2013 – SP)