1ª VRP|SP: Registro de Imóveis – Dúvida – separação judicial – partilha homologada por sentença com trânsito em julgado – qualificação registral que não pode discutir o mérito da decisão judicial – Dúvida improcedente.

Processo 1061580-20.2014.8.26.0100
Dúvida – Registro de Imóveis – R. M. A. P.
Registro de Imóveis – Dúvida – separação judicial – partilha homologada por sentença com trânsito em julgado – qualificação registral que não pode discutir o mérito da decisão judicial – Dúvida improcedente.
O 14º Oficial de Registro de Imóveis de São Paulo suscitou dúvida, a pedido de R. M. A. P., diante de sua negativa em registrar Carta de Sentença para averbar a separação e o divórcio da suscitada, na matrícula nº 10111.885/R-8, da mesma Serventia. Segundo o Oficial, a qualificação negativa do título ocorreu porque não foi apresentado ao registro o documento com a partilha do bem, visto que, em seu entendimento, ele foi adquirido a título oneroso de venda e compra. Em sendo o regime matrimonial da comunhão de aquestos, deveria ter sido necessariamente partilhado o imóvel (fls. 01/02).
A interessada aduziu que o imóvel em questão foi adquirido com o dinheiro recebido por doação de seu pai e, portanto, não se comunicou com os bens de seu ex-cônjuge. A separação consensual convertida em divórcio foi acordada e homologada na 2ª vara de Família e Sucessões no Foro Central Cível, nos autos do processo nº 100.09.315869-5, por sentença datada de 09/09/2009, transitada em julgado (03/11). Foram juntados documento às fls. 12/79; 87/124. Houve impugnação (fls. 80/86).
O Ministério Público opinou pela procedência da dúvida (fls.130/132).
Em resposta ao parecer ministerial, a interessada apresentou nova manifestação (fls.133/135). O membro do parquet reiterou o parecer anterior (fls. 140).
É o relatório. DECIDO.
Com razão a suscitada. De extrema importância salientar que a questão da partilha já foi solucionada na via judicial adequada, que tramitou perante a 2ª Vara da Família e Sucessões – Foro Central Cível. A autora apresentou rol satisfatório de documentos que comprovaram a sua tese. Quanto à separação consensual, restou claro que a interessada nada tinha para partilhar (fls.18). É inegável que a doação no valor de R$585.000,00 foi feita por seu genitor, W. G. P., e foi usada exclusivamente para o fim que se destinou, a compra do bem (fls.93/95; 103/106).
Também restou-se comprovada a isenção do imposto devido (ITCMD), conforme aprovado pela Procuradoria Geral do Estado de São Paulo (fls.87). Ademais, não se pode adentrar ao mérito da sentença que homologou o acordo de separação consensual e a consequente partilha, reconhecendo que o imóvel não integrava a universalidade de bens do casal, posto que objeto de doação. Nos termos do artigo 1659 do Código Civil: Art. 1.659. Excluem-se da comunhão: I – os bens que cada cônjuge possuir ao casar, e os que lhe sobrevierem, na constância do casamento, por doação ou sucessão, e os sub-rogados em seu lugar; O juiz apreciou a questão referente ao bem em apreço e proferiu sentença, que já transitou em julgado. Desta forma, não se pode mais adentrar no mérito da decisão e mudar seus efeitos legais nesta sede.
Nesse sentido, a r. decisão da emanada desta 1ª Vara de Registros Públicos, de lavra do MM. Juiz Narciso Orlandi Neto: “Não compete ao Oficial discutir as questões decididas no processo de inventário, incluindo a obediência ou não às disposições do Código Civil, relativas à ordem da vocação hereditária (artº 1.603). No processo de dúvida, de natureza administrativa, tais questões também não podem ser discutidas. Apresentado o título, incumbe ao Oficial verificar a satisfação dos requisitos do registro, examinando os aspectos extrínsecos do título e a observância das regras existentes na Lei de Registros Públicos. Para usar as palavras do eminente Desembargador Adriano Marrey, ao relatar a Apelação Cível 87-0, de São Bernardo do Campo, “Não cabe ao Serventuário questionar ponto decidido pelo Juiz, mas lhe compete o exame do título à luz dos princípios normativos do Registro de Imóveis, um dos quais o da continuidade mencionada no artº 195 da Lei de Registros Públicos. Assim, não cabe ao Oficial exigir que este ou aquele seja excluído da partilha, assim como não pode exigir que outro seja nela incluído. Tais questões, presume-se, foram já examinadas no processo judicial de inventário. (Processo nº 973/81)”.
Portanto, em caso de eventual desacerto da r. sentença proferida no âmbito jurisdicional, poderá o eventual interessado se valer dos recursos e ações previstos no ordenamento jurídico. O que não se permite, conforme a jurisprudência do C. Conselho Superior da Magistratura, é que a qualificação registrária reveja o mérito da sentença judicial que já transitou em julgado: “Registro de Imóveis – Dúvida julgada procedente – Formal de partilha – Inobservância do princípio da continuidade – Inocorrência – qualificação registral que não pode discutir o mérito da decisão judicial – Recurso não provido. (Apelação Cível nº 0909846-85.2012.8.26.0037)”.
Por fim, importante anotar que o cônjuge varão era consciente de que não tinha a disponibilidade do bem, celebrou o acordo de divórcio no pleno gozo de sua capacidade, de modo que não havia motivo para obstar a necessária homologação judicial e a produção de seus efeitos. Por todo o exposto, julgo IMPROCEDENTE a dúvida suscitada pelo 14º Oficial de Registro de Imóveis de São Paulo e determino o registro do instrumento apresentado. Não há custas, despesas processuais nem honorários advocatícios provenientes deste procedimento. Encaminhe-se à Serventia extrajudicial os documentos originais, após o trânsito em julgado desta decisão, que deverão ser retirados pelo interessado no prazo de 15 dias. Oportunamente, arquivem-se os autos.
P.R.I.C
(D.J.E. de 15.09.2014 – SP)